"Sonho é destino". "Dream is destiny". You do it to yourself, you do, and that's what really 'happens'. "Tudo que não invento é falso."

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quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

a palavra se fez carne


e habitou em nós...


Mais um erro clássico de tradução? A palavra se fez carne e habitou em nós, não entre nós....

O problema da filosofia é o estanque provocado pela linguagem. Mas a religião também sofre com isso. Na Bíblia temos alguns dos melhores casos. Veja Gênesis. A luz é a sabedoria. As trevas... a ignorância. As águas separadas são... andar sobre elas é... ... todos hermenêuticos sabem isso e de nada adianta culpar a missão civilizatória sem saber hermenêutica. É sobretudo treva, ignorância.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

wikinews

Eis o país da liberdade pretensa!


http://br.noticias.yahoo.com/s/reuters/101216/manchetes/manchetes_tech_assange_solto
aksFundador do WikiLeaks é libertado sob fiança

2 horas, 40 minutos atrás

LONDRES (Reuters) - O fundador do site WikiLeaks, Julian Assange, foi libertado sob fiança nesta quinta-feira, enquanto luta contra a extradição pedida pela Suécia, onde é acusado por crimes sexuais.
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Assange é alvo da fúria dos Estados Unidos por conta da divulgação pelo seu site de uma série de comunicações diplomáticas.

Na saída da prisão em Londres, Assange disse que espera continuar seu trabalho e a reivindicar sua inocência.

O juiz da Alta Corte Duncan Ouseley disse mais cedo que o australiano de 39 anos poderia ser libertado após pagamento de 200 mil libras (317 mil dólares) de fiança e sob condições rígidas, incluindo o cumprimento de um toque de recolher, se apresentar à polícia diariamente e usar um dispositivo de monitoramento eletrônico.

(Reportagem de Adrian Croft)

predição

Facebook cairá no natal!

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Dados ao ar

Dados ao ar



Não me sinto bem com este magnetismo
ele capta sentimentos
capta imagens
sons
fofocas, notícias
sussuros, namoros
caretas, belezas
micos, risos
Não creio nessa lei da física, imoral
Pela tremulação das frequências, socorro!
Percebo o dedo digitando denúncias
num teque teque teque sem parar
Mas o som do poder inexiste
Capta-se apenas o modal
Mudo tônico
analógico
ultrassônico
biológico
Agora bactérias processam informações em bits
e meu estômago sente sua falta
Que dor! Terrível!
Que belo! Incrível!
Um som num dado magnético
postado no cibernético
virtual mundo real.

sábado, 11 de dezembro de 2010

App para Iphone identica aviões no céu

App para Iphone indica o trajeto, e outros detalhes, de aviões ao apontar o aparelho para o céu, para a direção avistada, no momento em que um avião passa.

Relato em inglês de um blog com a notícia e a loja da apple para apps seguem abaixo.

"I haven't downloaded this yet, just noting the buzz around the blogs today: Plane Finder AR is an iPhone augmented reality app that promises to identify the origin and destination of any plane you might point your phone toward, overhead in the sky. A quick peek at the app's entry in the iTunes store shows some very upset user reactions: the $2.99 app only works with planes carrying ADS-B equipment, and only in areas where the app developer has equipment in place to read those signals. Sounds like Australia is the only country so far with full ADS-B coverage. Again, the developer is not using FAA data, so caveat downloader.

Still: I'll give it, oh, 30 minutes before a US lawmaker flips out over the app as a perceived terror threat."

http://www.apple.com/itunes/download/

sábado, 27 de novembro de 2010

A conversão da Imaginação nas Confissões de Santo Agostinho, por José M. Silva Rosa

A conversão da Imaginação nas
Confissões de Santo Agostinho

Índice
Da possibilidade de conversão da Imaginação 1
Entre a denúncia e o fascínio 9
Da possibilidade de conversão da Imaginação
“A ideia de conversão - afirma Pierre Hadot, na sua obra Exercícios
espirituais e filosofia antiga -, representa uma das noções constitutivas
da consciência ocidental. Com efeito, pode representar-se toda a
história do Ocidente como um esforço, renovado sem cessar, por aperfeiçoar
as técnicas de ’conversão’, isto é, as técnicas destinadas a transformar
a realidade humana, quer reconduzindo-a à sua essência origi-

Texto originalmente publicado in M. C. Pacheco - J. F. Meirinhos (Éds.), Intellect
et imagination dans la Philosophie Médiévale / Intelelect and Imagination in Medieval
Philosophy / Intelecto e Imaginação na Filosofia Medieval. Actes du XIe Congrès
International de Philosophie Médiévale de la Société Internationale pour l’Étude de
la Philosophie Médiévale (S.I.E.P.M.), Porto, du 26 au 31 août 2002, (Rencontres de
Philosophie Médiévale, 11), Brepols Publishers, Turnhout, 2006, vol. II, pp. 783-
797.

nal (conversão-retorno [epistrophê]) quer modificando-a radicalmente
(conversão-mutação [metánoia]”1.
À luz deste asserto do importante estudioso do fenómeno da conversão,
importa, e muito, para o nosso propósito, interrogarmo-nos sobre
a possibilidade de a imaginação ser ou não passível de conversão e,
em caso afirmativo, qual a natureza dessa modificação. É um lugarcomum
lembrar que a tradição platónica insiste na possibilidade e na
necessidade de conversão da inteligência, iniciada precisamente com
a suspeita de que as sombras projectadas no fundo da caverna não
são reais, continuada depois na observação dos objectos-imagem e na
compreensão das relações matemáticas e geométricas (no Ménon) e,
finalmente, consumada no momento da contemplação intelectual das
ideias (noésis, intellectus). É certo que o exemplo do escravo do Ménon,
conseguindo compreender a relação entre diagonal e área do quadrado
a partir de um desenho na areia, é um passo especial na economia
do platonismo, como bem sublinhou Victor Goldschmidt2, mostrando
também a possibilidade de a imaginação sensível ou suposição (eikasia)
ajudar compreensão das realidades inteligíveis. Seguindo esta
pista e amplificando-a, poder-se-ia defender que, em Platão, a estrutura
geral da realidade enquanto aparecer - phainesthai, i.é, uma fainomeno+
logia radical, desde as sombras às ideias - é mais importante
do que a teoria da alma, o que permitiria dar outro valor ao papel da
imaginação. Seja como for, na economia geral do pensamento platónico3
pp. 23-55. (v.g., República VI-VII), a imaginação acaba por ser
considerada sobretudo com suspeição, pois induz em ilusão, de modo
especial quando ficciona (eidôla)

(Rep. 382b; 510a; 516a; 520c; 532b;
1HADOT P., Exercices spirituels et philosophie antique, Paris, Études Augustiniennes,
1981, pp. 175-176 (cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Stromata, IV, VI,
27, 3)2Le paradigme dans la dialectique platonicienne, Paris, PUF, 1947
3Cf. CAMASSA G., "Phantasia da Platone ai Neoplatonici", in Phantasia-
Imaginatio. Atti del V Colloquio Internazionale del Lessico Intelettuale Europeo,
Roma, 9-11 gennaio 1986 (Atti à cura di M. Fattori e M. Bianchi), Roma, Edizioni
dell’Ateneo, 1988

Soph. 235a-236c) falseando os juízos que assim não passam de opiniões.
Poderíamos dizer que imaginação não é facilmente introduzível
no ciclo da pólis, não é domesticável por uma lei, por uma verdade ou
por um bem, como a inteligência e a vontade. Em suma: a imaginação
é pouco política.

Ora, quase no pólo oposto, a ideia de metanoia da alma no pensamento
grego em geral, e platónico em particular, tinha um alcance eminentemente
político, coincidindo com o próprio processo da paideia,
i.é, da formação ou educação do homem grego, como bem sublinhou
Werner Jaeger5: a conversão é princípio da paideia, e esta consiste
num processo global de conversão, de askhesis (exercício), de esclarecimento
dos fins, de modo que o olhar da alma se volte em direcção à
Verdade e ao Bem.

Aristóteles, no De Anima6, parece um pouco mais optimista no
que se refere ao papel da imaginação no processo do conhecimento.
Afirma ele: “A imaginação (phantasia), com efeito, é distinta da sensação
(aisthêsis) e do pensamento (diánoia), ainda que não possa existir
sem sensação. (...) É, portanto, a faculdade em virtude da qual nós
dizemos que uma imagem (phantasma) se produz em nós...” Afirma,
além do mais, que a alma não pode ajuizar sem estes fantasmas, i.é,
sem representações imaginárias. Por isso a imaginação surge assim
como uma instância fundamentalmente mediadora na actividade judicativa.
Apesar do veredicto, todavia, não é fácil determinar em que
consiste a natureza exacta desta mediação. Deste modo, quer em Platão
quer em Aristóteles, e por comparação com a diánoia e o noús, a
4Parafraseando o dito de Aristóteles, a propósito da siringe, na Política, segundo o
qual "a flauta frígia não é política". Mas hoje talvez se devesse acrescentar que a política
não tem imaginação, de acordo com uma das palavras de ordem do Maio de 68:
“Imagination au pouvoir!”

[cf. BRUNET É., “Rêverie statistique sur l’imagination,
de la revolution à Mai 1968”, in Phantasia-Imaginatio. Atti del V Colloquio..., pp.
477-512
5Cf. Paideia. A formação do homem grego, São Paulo, Martins Fontes, 1995 (cf.
República 518 c)
6III, 3, 427b-428a

Imaginação surge como uma faculdade menor, completamente dependente
de uma teoria psicologizante das faculdades. E - releve-se-nos
o esquematismo que não pode dar conta dos muitos matizes, nomeadamente
nas correntes filosóficas do helenismo, como o estoicismo a
(phantasia kathaleptikê) - o pensamento oficial posterior7, na linha de
Platão, Aristóteles, Agostinho e sobretudo da síntese de Boécio, manterá
aquela visão psicologista e suspicaz: tolera-se a imaginação um
pouco como uma faculdade bastarda, serva, passiva, reprodutiva, e só
sob a condição de ser continuamente policiada8.
É por isso que a valorização da dimensão imaginal activa, já na antiguidade
e depois na Idade Média latina, se dará sobretudo nas margens,
ou seja, nos movimentos teológicos e exegéticos mais ou menos heterodoxos,
quer judeus (Fílon de Alexandria) quer cristãos (Orígenes,
Escoto Eriúgena) quer árabes (Ibn Arabi9), no pensamento marginal
dos visionários apocalípticos, dos milenaristas, dos místicos (Pseudo-
Dioniso, Joaquim de Fiore, Mestres renanos, etc.), ou ainda na gesta
cavaleiresca do amor cortês, sendo muito difícil a sua integração nas
ortodoxias oficiais, as quais insistem mais no seu carácter passivo e
reprodutor.

Além do mais, a ideia geral de Agostinho de que a imaginação é
uma faculdade potencialmente herética10, lançada no calor da polémica
contra maniqueus, arianos e pelagianos, fez-se sentir pesadamente
7Remetemos para os estudos de BAUTIER A,-M.,

“Phantasia-Imaginatio.
Del’image à l’imaginaire dans les textes du Haut Moyen Âge”, e de HAMESSE J.,
“Phantasia-Imaginatio chez les auteurs philosophiques du 12e et du 13e siècle”, in
Phantasia-Imaginatio. Atti del V Colloquio..., pp. 81-104; pp. 153-184, respectv.
8Cf. DURAND G., L’imagination symbolique Paris, PUF, 1964, p. 15 3 ss. Cf.
também nosso estudo “Simbolismo da domus religionis no Liber de Concordia..., de
Joaquim de Fiore”, Lisboa, Universidade Católica Editora, (no prelo).
9Cf. CORBIN H., L’imagination créatrice dans le sufisme d’Ibn Arabi, Paris,
Aubier, 1992.
10Cf. TESKE, R. J., “Heresy and Imagination in St. Augustine”, Studia patristica
27, Leuven, Peters Press, 1993, pp. 400-404; Contra Iulianum, 2, 34: “Sic tecum
uana et insana tui cordis imaginatio fabulatur, quasi me ante Pelagianos iudices tecum constituas...”

na tradição latina posterior.
No oriente ortodoxo a cruzada conta as
imagens e contra imaginação atingiu proporções inimagináveis, com a
crise iconoclasta, nos sécs. VIII-IX. Mas com a vitória dos iconódulos,
primeiro doutrinal, no Concílio de Niceia, em 787, e depois política,
em 843, dá-se uma fortíssima e vertiginosa recuperação de toda arte
simbólica-religiosa (hinologia, pintura, arquitectura, paramentaria, relíquias,
etc.), de modo especial com a pintura dos ícones da Santa Face
e da Transfiguração. O argumento mais importante dos iconódulos
centrava-se na doutrina da Encarnação, definida pelo Concílio de Calcedónia.
As imagens não são só “sermões silenciosos”, “livros para os
iletrados”, “memoriais dos mistérios de Deus”, mas sinais da santificação
da própria matéria uma vez que nela o Verbo se fez carne. Assim,
porque o invisível se tornou visível, este torna-se legitimamente via
para o invisível, e a imaginação criadora encontra assim um lugar teológico
e mesmo místico. A afirmação cristã da Santa Humanidade
de Cristo, por exemplo, na contemplação do Deus-Menino, no Presépio
de S. Francisco de Assis, torna-se assim o espaço de respiração da
imaginação.
Recuando e mudando um pouco o contexto para a tradição bíblica
veterotestamentária, quer na experiência da Aliança quer na tradição
profética e penitencial do Salmo 50 - o conhecido Miserere de David
- se fala na possibilidade de uma real mudança de vida, de uma conversão
do coração e da vontade, sempre que se acolhe e se põe em
prática a vontade de Deus. E pelo facto de as razões da vontade de
Deus nem sempre serem claras, sai reforçada a dimensão obediencial
da acção, apelando-se então para uma insondável eleição ou graça que
elege quem quer, quando quer e como quer. Isto é válido tanto individualmente,
como para o povo todo. Também no âmbito do Novo
Testamento se pode dizer que esta possibilidade de mudança real de
vida funda o próprio anúncio messiânico de Jesus: “Está perto o Reino
de Deus. Convertei-vos e acreditai no Evangelho!” (Mt 3, 2; 4, 17;
Mc 1, 15) Segue-se, portanto, que a ideia da conversão quer da inteligência
quer da vontade, ainda que com predominância relativa de uma

ou de outra (relatividade presente na tradição hagiográfica anterior, por
exemplo, nas conversões de S. Paulo, S. Justino, S. Antão, etc., e até
mesmo na de Mário Vitorino que tanto impressionou Agostinho), já estava
literariamente disponível para alguém que, por exemplo, quisesse
testemunhar a sua evolução espiritual do modo como Agostinho o faz
nas suas Confissões. Mas é precisamente aí, de modo particular quando
a memória é chamada a este processo confessional, que o problema
não resolvido do platonismo - a integração positiva da imaginação, entre
as faculdades da alma -, bem como a prescrição bíblica que vela
pela fidelidade monoteísta: “Não farás imagens” (Ex 20, 2-5), se encontram
perante as duas possibilidades que P. Hadot sublinhava acima,
e que em Agostinho continuamente se recruzam: ou converter a imaginação
a uma espécie de visão adâmica original, pré homo peccator
(conversão-retorno), ou impetrar de Deus a graça para aquilo que só ela
pode fazer: a modificação radical do homem (conversão-mutação) ou,
parafraseando o Salmo de David em discurso directo: “Criai em mim,
ó Deus, uma imaginação pura...”, etc. (Sl 50, 12).
Neste sentido, não podemos evitar que neste momento nos deparem
algumas perguntas decisivas: em que consistiria, então, uma suposta
conversão da imaginação? Mais radicalmente ainda: será a imaginação
uma potência convertível como a inteligência ou a vontade, ou não
estará ela num plano antropológico mais radical, numa instância primordial
de relação com a realidade, religiosamente neutra, anterior e
resistente a qualquer discurso moralizador, que assim será sempre tardio?
Deve dizer-se que, na linha de uma recuperação positiva da imaginação
que começou já no renascimento (Marcílio de Ficino, mestres
de Pádua), recuperação depois continuada na viragem para o esquematismo
transcendental11 e a imaginação poiética e genial no idealismo e
no romantismo alemães (Kant, Fichte, Schelling, Hegel, Schiller, Go-
11A tradição racionalista cartesiana (Regras para a direcção do espírito, XII) ou
empirista de F. Bacon (De Argumentis scientiarum) e D. Hume continuam simplesmente
a concepção tradicional da memória passiva e reprodutiva.

7
Eethe, bem como na fenomenologia (Husserl), vão neste sentido as actuais
teorias do imaginário, depois dos trabalhos de Jung, Cassirer, Bachelard,
Corbin, Durand, Abellio, Alleau, e mesmo Ricoeur, apenas
para referirmos alguns dos autores mais significativos. Neste sentido,
talvez a imaginação deva ser desanexada da velha teoria das faculdades
da alma12, que infectou de psicologismo todas as posteriores teorizações
sobre a imaginação, para então se poder revelar um outro poder
e uma outra compreensão da tangência possível entre a alma e a realidade.
Mas, à parte as considerações sobre as actuais teorias do imaginário,
suponha-se que defendíamos a convertibilidade da imaginação: o
é que é que tal significaria? A alteração dos motivos e dos conteúdos
imaginados, i.é, passar a imaginar coisas diferentes das que até
aí se figuravam, elevar o espírito às coisas boas, puras e santas, como
certa piedade popular de cura d’almas ou certas pedagogias espirituais
preconizam? Mas objectemos contra esta possibilidade: a simples mudança
dos objectos imaginados poderia constituir qualquer espécie de
conversão? Não residiria aí o perigo, precisamente a pior das perversões
espirituais, de continuar imaginar tais realidades sempre e ainda
do mesmo modo que as anteriores, deixando a própria faculdade inalterada,
inconvertida, mesmo quando peça para ser livre das tentações?
Não seria isto, precisamente, o esquecimento mais grosseiro da admonição
bíblica de que é um coração humilhado e contrito que agrada
ao Senhor, e não as oblações, os holocaustos e os sacrifícios, i.é, os
conteúdos do ritual?
Será então, ao invés, a conversão da imaginação uma mutaçãoalteração
da própria faculdade imaginativa, passar ver/imaginar de forma
diferente, ainda que seja as mesmas realidades? Mas não será isto matar
a imaginação enquanto tal, substituindo-a por outra coisa diferente
12Cf. STAROBINSKI J., “En guise de conclusion”, in Phantasia-Imaginatio. Atti
del V Colloquio..., pp. 578 e ss; e de DURAND G., para além de L’imagination
symbolique, cf. também Mito, Símbolo e Mitodologia, Lisboa, Presença, 1982, pp.
15 e ss

dela? Certas narrativas de experiências religiosas e místicas defendem
precisamente a necessidade desta morte da humana imaginação, única
maneira de “ver o mundo pelos olhos de Deus” ou de aceder a um plano
onde a imaginação já não é humana, mas ao invés participação mística
numa esfera/visão angélica.
Todavia, certa apologética cristã, fazendo pesar sobre a imaginação
o preconceito de “louca da casa”, “mestra do erro e da falsidade”
e fonte de todas as heresias, mais parece defender a morte da imaginação,
não por razões contemplativas ou místicas, mas por razões tão-só
doutrinais. A imaginação é fonte de divergência e subversão na comunidade
dos crentes, e deve ser tratada como um herege em potência: ou
se converte ou morre. Mas a questão é precisamente esta: como é que é
possível ela converter-se e não morrer? “Converter-se” não significa de
certo modo “morrer”? Não residirá aí, portanto, outro equívoco? Por
outro lado, como escapar ao fascínio que as imagens exercem sobre
alma? Como convocar as espantosas potências da imaginação (perante
as quais Agostinho como que entra em pavor sacer), sem se deixar
prender pela quase-materialidade que as imagens transportam consigo,
sem cair na tentação de imediatamente tentar domesticá-las, moralizálas
e atribuir-lhes significados? Não reside aqui uma das maiores armadilhas
de todo o pensamento representativo, e até simbólico, como
denuncia Michel Serres13? É pois aqui a própria possibilidade de conversão
da imaginação que está em causa.

Agostinho sentiu profundamente esta dificuldade, mesmo depois da
conversão. Numa paradoxal dialéctica de fascínio e exorcismo, ainda
fala numa espécie de visco ou de fixação da imaginação encantada pelas
imagens, como se houvesse uma espécie de familiaridade ou natureza
congénita entre certas partes da alma e as imagens.
Seja com for, por se situar num nível simbólico e cultural muito
profundo, a conversão da imaginação é um dos processos mais com-

13SERRES M., Para celebrar a partilha, (Conferência proferida pelo autor no dia
5 de Novembro de 1992, por ocasião da inauguração da Villa Kujoyama, Kyoto,
Japão), Villa Kujoyama, Kyoto, s.d


plexos do processo global de conversão de Agostinho. Por isso, ele
é um protagonista-tipo de um processo mais amplo de reconversão do
imaginário de toda uma cultura que progressivamente vai matando Pã e
se cristianiza. Neste processo de conversão cultural, o cristianismo encontrou
aliados naturais em algumas correntes filosóficas (platonismo,
o neoplatonismo) que também lutavam contra as ilusões da eikasia e
da phantasia. Por isso, lendo as Ennéades, lendo Porfírio e sobretudo
lendo-se a si próprio, Agostinho não podia deixar de se rever na afirmação,
recorrente no neoplatonismo, de que somos vítimas da nossa
imaginação. Inicia-se assim um processo de purga da imaginatio em
favor do intellectus.

Para concluir este breve adensamento interrogativo, temos, portanto,
que a ideia de uma conversão da imaginação é problemática e
quase aporética. Pode sair-se desta dificuldade? Atentemos em alguns
dos principais momentos do percurso de Agostinho, narrado nas Confissões.
Entre a denúncia e o fascínio
Pode começar por dizer-se que, à luz do percurso biográfico presente
nas Confissões14, são compreensíveis as desconfianças de Agostinho
relativamente às imagens e à imaginação. Com efeito, na sua interpretação
posterior, muito acusadora e rigorista, elas foram o isco e a rede
com que os maniqueus o atraíram para as suas fábulas.

Contudo, o sucesso dos maniqueus não se explica só pelo facto de
as suas doutrinas estarem recheadas de histórias fantásticas, cheias de
drama, de colorido e exuberância, mas sobretudo pelo facto de a imaginação
associativa ser uma das faculdades mais importantes na actividade
psicológica do jovem retor. Com efeito, entre outros talentos,

14Confissões, III, II, 3-4; VI, 10; IV, XV, 26-27; V, X, 20; XI, 21; VI, III, 3; XIV,
24; VII, I, 1-2; V, 7; VII, 11; IX, IV, 10; X, 25; X, VIII, 12.14; IX, 16; XII, 19; XVI,
25; XXX, 41-42; X, XIII, 15; XVIII, 24; XXVII, 34; XII, VI, 6.

Agostinho era dotado de uma prodigiosa faculdade imaginativa, o que
por outro lado o fascinava. E um quadro cultural pagão e politeísta,
habituado a tudo representar sensivelmente, desde os deuses à natureza
com que, amiúde, se confundiam - aspectos que, conjuntamente
com a sua paixão pela representação teatral15, tanto o impressionaram
no primeiro contacto com Cartago -, associado ao intenso treino nas
mnemotécnicas da retórica antiga, recorrentes sobretudo à memória e à
imaginação (Aristóteles, De Anima, III, 3; Cícero, De Oratione, II, 86-
87), criaram no jovem Agostinho um imaginário naturalmente pagão e
estruturalmente divertido, i.é, voltado para as realidades exteriores, de
onde resultava uma incapacidade de conceber qualquer realidade espiritual.
Com efeito, na confissão retrospectiva de Agostinho uma das
observações mais recorrentes é a da acusação à sua fértil e incontinente
imaginação: foi ela que o enredou nas malhas do materialismo, que
o arrastou para a crença nas “fábulas das duas substâncias” do maniqueísmo,
para “as regiões das trevas e da luz”, etc.

Na narrativa autobiográfica de Confissões, a linguagem relativa ao
imaginário, à imaginação e às imagens vem para primeiro plano, no
Livro III, quando Agostinho refere a sua paixão pelo teatro e pelo jogo
cénico. “Arrebatavam-me os espectáculos teatrais cheios de representações
das minhas misérias e das faúlhas do meu fogo.” (III, II, 2). Ia
“seguindo a inanidade da glória popular até aos aplausos do teatro e
aos certames de poesia” (IV, I, 1), “E daí vinham os amores da dor, não
para ser invadido mais profundamente por ela - de facto não gostava
de padecer as mesmas coisas que via representar -, mas para que, ouvidas
elas e imaginadas, como que por elas fosse roçado à superfície...”
(III, II, 4).
Tal necessidade quase táctil, bem assim o deleite provocado por estas
ficções imaginárias, como que hipertrofiaram temporariamente outras
faculdades, de modo especial a da intelecção das realidades inteligíveis,
pois quando tentava compreendê-las, falhava sistematicamente,
15Chegava a chorar assistindo à representação da despedida de Dido e Eneias (Confissões,I, XIII, 21; cf. III, II, 2)imaginando-as à maneira dos corpos materiais. Assim, concluía pela sua irrealidade. O percurso intelectual de Agostinho, portanto, testemunha bastante bem as dificuldades que existem em coordenar o intelecto
e a imaginação, o que provavelmente não se deve tão-só a uma sua idiossincrasia, mas é um problema que releva da própria estrutura do espírito humano 16.

De qualquer modo, quando os maniqueus lhe apresentaram uma
espécie de romance, filme ou história colorida de toda a realidade (no
fundo é esta a aspiração da gnose), pleno de narrativas fantásticas sobre
o princípio, o meio e o fim; sobre a terra de luz e a raça das trevas,
sobre as lutas primordiais, as estratégias do Pai das Luzes, o nascimento
dos astros, da terra, do homem, etc., Agostinho aderiu com ardor a
estes “contos de fada persas” (na sua crítica posterior). Podemos dizer
que, paradoxalmente, contra o seu desejo de tudo compreender e de em
nada acreditar, com a adesão ao maniqueísmo, a imaginação tornou-se
a faculdade central e quase exclusiva de Agostinho, e isso teve graves
consequências sobretudo quando se tratou de compreender a natureza
da realidade divina. Confessa ele: “julgava que tu, Senhor, Deus,
Verdade, [eras] um corpo luminoso e infinito e eu uma parcela desse
corpo. Que enorme perversidade!” (IV, XVI, 31). “E, assim, era
repelido, e tu resistias à minha enfatuada obstinação, e eu imaginava
formas corpóreas, e, sendo carne, acusava a carne, e, sopro errante,
não voltava a ti e, caminhando, caminhava para aquilo que não é,
nem em ti nem em mim, nem no corpo, nem me era sugerido pela tua
verdade, mas congeminado pela minha vaidade a partir do corpo...”
(IV, xv, 26) 17.

Estamos aqui no ponto central das acusações de Agostinho contra

16Epistula 7, 3: “Quae si absurda sunt, sicuti sunt, nihil est aliud illa imaginatio,
mi Nebridi, quam plaga inflicta per sensus, quibus non, ut tu scribis, commemoratio
quaedam fit, ut talia formentur in anima, sed ipsa huius falsitatis inlatio siue, ut
expressius dicatur, impressio.”
17Sermo 34, 3: “Quid ergo humana imaginatio et uolatica cogitatio fingit sibi deum,
et in corde suo fabricat idolum, componens qualem potest cogitare, non qualem meruit
inuenire? Talis est deus? Non, sed talis est.”

a imaginação. A razão porque Agostinho tanto a invectiva, já em si,
quando fora maniqueu, já em todos os heréticos, de modo especial nos
maniqueus e arianos, é porque ela é um fonte de erro na compreensão
da natureza de Deus, conduzindo ora ao antropomorfismo maniqueu,
ora materialismo estóico, ora ao triteísmo ariano18, ora ainda a todos os
devaneios das mentes animalescas e carnais (VII, I, 1-2), incapazes de
compreender a natureza das realidades inteligíveis e, acima de todas,
de Deus semper, semel et simul, que só pode ser captado pela contemplação
espiritual, e nunca imaginado à maneira das coisas materiais.
Quando tal acontece, o resultado é que a alma só se alimenta de “fantasmas
corporais”: “Em que espécie de frivolidades me apascentava
eu nesse tempo, e não me alimentava. (...) Tu nem és esses corpos
que vemos, embora estejam no firmamento, nem aqueles que aí não
vemos, porque tu os criaste e não os tens entre as tuas mais sublimes
criaturas. Portanto, quão longe estás daquelas minhas fantasias, das
fantasias corporais, que não existem em absoluto!” (III, VI, 10).
O ponto em comum das “mentes carnais” que tentam imaginar
Deus é que todas caiem sobre as suas próprias fantasias, ficcionando
sempre e só falsas imagens. A idolatria da imaginação, portanto, está
na raiz das heresias quanto à substância divina. “[A minha alma] tinha
criado para si mesma um Deus pelos infinitos espaços de todos os
lugares, e tinha julgado que esse eras tu, e tinha-o colocado no seu
coração, e tinha-se tornado de novo templo do seu ídolo” (VII, XIV,
20). Este foi o seu maior erro, confessa Agostinho, “porque, querendo
pensar no meu Deus, não sabia pensar senão em massas corpóreas -
pois nada me parecia existir que não fosse assim - essa era a maior e
quase única causa do meu inevitável erro” - “sola causa erat ineuitabilis
erroris mei.”
A relação de coordenação e de quase-equivalênca entre imaginação
e heresia, que já tinha tradição entre os Padres anteriores, se em
18Cf. TESKE R. J., “Augustine, Maximinus and Imagination”, Augustiniana 43
(1993), pp. 27-41; O’CONNELL R. J., “The God of Saint Augustine’s Imagination”,
Thought 57 (1982), pp. 30-40.
Agostinho aprofunda as suas razões, também ganha nele o valor de
um testemunho pessoal. Por isso mesmo, deve merecer-nos particular
atenção o relato da sua conversão ao neoplatonismo, no livro VII de
Confissões, para ver como é que a imaginação sai desse processo.
Curiosamente, uma vez que a confissão retrospectiva culpabilizava
sobretudo a imaginação materialista, seria de esperar que a sua conversão
ao neoplatonismo alterasse radicalmente o quadro imaginário, incidindo
muito mais sobre os aspectos intelectual e religioso. É certo que
Agostinho sublinha a mudança de orientação para a interioridade e a
descoberta de si próprio: “Admoestado a voltar daí [do exterior] para
mim mesmo, entrei no mais íntimo de mim (...)”. Porém, ainda que o visível
tente sugerir inteligível, quadro imagético mantém-se, mostrando
Agostinho até uma certa hesitação por causa disso: “Entrei e vi com o
olhar da minha alma, seja ele qual for, acima do mesmo olhar da minha
alma, acima da minha mente, uma luz imutável, não esta vulgar e
visível a toda a carne, nem era uma maior como que do mesmo género,
como se ela brilhasse muito e muito mais claramente e ocupasse tudo
com a sua grandeza. (...) E deslumbraste a fraqueza do meu olhar, brilhando
intensamente sobre mim, e estremeci de amor e horror” (VII, X,
16). E Agostinho confessa que, por um momento ao menos, “chegou
àquilo que é, num relance de vista trepidante”, (VII, XVII, 23), apesar
de não ter conseguido “fixar o olhar”, repelido pela sua fraqueza - “et
peruenit ad id quod est in ictu trepidantis aspectus”.
Que experiência é esta que Agostinho aqui nos confessa? A hermenêutica
agostiniana ortodoxa, por vezes ávida de etiquetas, costuma
referir-se aqui à conversão da inteligência, à descoberta da realidade
espiritual e inteligível, enfim, à descoberta de Deus como ser eterno,
imutável e perfeito. Bem na linha de Platão e Plotino, Agostinho descreveria
aqui uma espécie de intuição intelectual, ao dizer que viu “com
o olho da alma” - “oculo animae meae”. Mas o que é ver com a pupila
do espírito? Ter-se-á transmutado a imaginação materialista em uma
espécie de imaginação de segundo nível, em uma imaginação noética,
de nível superior? Haverá aqui um fenómeno de transfert espiritua
lizante19?

Ele diz que “viu acima da mente”, tentando logo rejeitar,
sem muito sucesso, a quase-espacialidade que imediatamente se intromete20,
a qual, a acreditar em Bachelard e em Merleau-Ponty, denuncia
ainda e sempre a presença de um poiética imaginal.
Agostinho, aliás, confessa não compreender muito bem como esta
passagem se deu, como é que conseguiu “desviar o pensamento do
hábito” (Cícero, Tusculanas, I 38) e “subtrair-se às multidões antagónicas
dos fantasmas”, revelando até mesmo um certo espanto: “E
admira-va-me por já te amar a ti, [e] não a um fantasma em vez de
ti...” (VII, XVII, 23).

Esta admiração de Agostinho é assaz significativa e merece ser aqui
sublinhada, pois denuncia ou indicia precisamente a existência de um
vazio entre imaginação e intelecto, antagonismo que o neoplatonismo,
e sobretudo Porfírio, tinham acentuado, muito mais do que Platão21.
Por isso, ao recusar a seguir o orgulho dos neoplatónicos, fruto mal-são
dessa visão espiritual inchada de si mesma, e ao aceitar seguir, humilde,
o humilde Verbo encarnado, poderia ter também preenchido aquele vazio,
como aliás também a referência explícita à Carta aos Romanos 1,
20 lhe permitia. “Mas então, lidos aqueles livros dos Platónicos, e depois
de por eles ter sido levado a procurar a verdade incorpórea, vi e
compreendi as tuas coisas invisíveis por meio daquelas que foram feitas...”
(VII, xx 26). Com efeito, os platónicos contemplaram as ideias,
mas não realizaram o que sabiam; viram a pátria, mas ignoraram a
via22. Cristo, Verbo Encarnado é a via ignota dos platónicos.
Com esta crítica, e à luz da Encarnação do Verbo, Agostinho tinha

19A expressão é de CHENNU M. D., a propósito do pseudo-agostiniano De spiritu
et anima, apud HAMESSE J. op. cit., p. 159.
20Esta topologia (simbólica) parece precisamente ser constitutiva do imaginário,
como frisou BACHELARD G., La poétique de l’espace, Paris, PUF, 1958;
MERLEAU-PONTY M., Sinais, Lisboa, Minotauro, 1962, p. 33.
21Cf. BUNDY M. W., The theory of imagination in classical and mediaeval
thought, Ilinois, Urbana, 1927, p. 179 e ss., apud HAMESSE J., op. cit., p. 161.
22MADEC M., La patrie et la voie. Le Christ dans la vie et la pensée de Saint
Augustin, Paris, Desclée, 1989

possibilidades de recuperar as mediações desconhecidas dos platónicos
e encontrar forma recuperar outras possibilidades para a imaginação23,
ou até diferentes níveis de imaginação, longe do reducionismo de uma
teoria exclusivamente psicologista das faculdades da alma, o que ele,
aliás, aceita no caso dos sonhos - pois certos sonhos eram, para Agostinho,
revelações divinas (III, XI, 19-20.23; IX, X, 25) -, e assim a
salvaria igualmente da acusação de ser a mãe das heresias.
Agostinho, tal como fizera para superar a ontologização do mal, do
maniqueísmo (De Natura boni), poderia e deveria ter começado por
descompactar também o seu próprio discurso sobre a imaginação, diferenciando
níveis, encontrando a sua topografia íntima, a sua geometria
variável, desde um nível representativo e passivo até uma possível imaginação
poiética, uma vis formandi. E não o ter feito é tanto mais paradoxal
quanto mais é precisamente isso que fez na análise dos “vastos
palácios da memória” e dos seus conteúdos, ao longo de todo o livro
X, que é verdadeiro hino à força da imaginação, aqui chamada memória,
mas sempre concebida como faculdade meramente representativa,
ainda quando compõe novas formas a partir das sensações. Quanto
aos graus da memória, admitiu a existência de um plano ontológico ou
metafísico24, um lugar “interior intimo meo et superior summo meo”
(III, VI, 11) de abertura transpsicológica ou de memoria Dei. No livro
X, Agostinho esteve perto do que poderíamos hoje chamar uma
“imaginação criadora” e compreendeu bem, em termos quase aristotélicos25,
que a memória é indissociável da faculdade formar imagens,
mas parece ter ficado aterrorizado com qualquer coisa, talvez com o
seu carácter abissal: “Grande é o poder da memória, [tem] um não
sei quê de horrendo...” (X, XVII, 26). Porquê este horror, semelhante

23No De Trinitate, IX, 16, não ataca a imaginação, mas antes o juízo ou a aprovação
(approbatio) feito com base na similitudo que a imaginação elabora
24Cf. O’CONNELL R. J., Imagination and Metaphysics in St. Augustine, Milwaukee,
Marquette University Press, 1986. O pendor aristotelizante e a identificação
entre imaginação e memória limitam muito este estudo e deixam-no longe do que o
título prometia
25Cf. De Vera religione, X, 18.

ao da experiência numinosa do livro VII: “estremeci de amor e horror...”?
Será porque pressentiu que a imaginação tem de facto um certo
poder criar, função exclusiva de Deus, e que assim, orgulhosamente, a
criatura poderia elevar-se ao nível do Criador? Com efeito, em certas
releituras medievais Deus cria com a imaginação...
Seja como for, e em suma, o que a intuição intelectual do livro
VII parecia prometer, como possibilidade de recuperação da imaginação
a um nível poiético, acabou por não ter nenhum alcance por aí
além. Como se a memória, a inteligência e a vontade fossem precisamente
imago da Trindade, cuja harmonia é ameaçada por esse intrusivo
quarto elemento, a imaginação, quaternidade feminina, maléfica, como
sublinhou justamente C. G. Jung26.

Agostinho tanto padece do fascínio das imagens como, simultaneamente,
lhe teme os efeitos; teme o seu estatuto anfibológico, a ambiguidade
latente na imaginação, a sua espessura sensível; teme a possibilidade
de por esse mundo especular e imaginal se insinuarem as
tentações e as adivinhações demoníacas, as ciladas dos espíritos imundos,
que povoam os espaços intermediários do sonho e da imaginação,
bem assim se insinuarem as tentações da sua carne libidinosa. O texto
que segue é deveras expressivo a este respeito: “Mas ainda vivem na
minha memória, sobre a qual tanto falei, imagens dessas tais coisas
que o meu hábito nela fixou, e, embora desprovidas de forças, vêm ao
meu encontro quando estou acordado, mas, durante o sono, chegam
não só ao deleite, mas também ao consentimento e a um efeito absolutamente
igual. A ilusão na minha alma tem tanto poder na minha
carne que, estando eu a dormir, as falsas visões levam-me àquilo que,
estando acordado, as verdadeiras não conseguem. Acaso, Senhor meu
Deus, não sou eu nesse momento?” (X, XXX, 41)27.

26Cf. JUNG C.G., Interpretação psicológica do dogma da Trindade, Petrópolis,
Vozes, 1994.
27“E, todavia, é tão grande a diferença entre mim e mim mesmo, naquele momento
em que passo da vigília ao sono e volto a passar do sono à vigília! Onde está, pois,
a mente, graças à qual uma pessoa acordada resiste a tais sugestões e, se as próprias
coisas se lhe deparam, permanece inabalável? Porventura fecha-se a mente ao mesmo

Poderemos concluir daqui que, em regime diurno, a imaginação
pode ser moralizável, então pode voltar-se “à tranquilidade da consciência”,
como Agostinho constata, mas em regime nocturno, ela vagabundeia
os seus próprios caminhos, aquém e além do bem e do mal, das
definições teológicas e dogmáticas, dos cânones exegéticos, das regras
morais, da legalidade jurídica, do poder político. E ainda bem, porque
nesse espaço originário e indomado, em que a Idade Média também foi
fértil, bem podem residir, neste tempo de encruzilhadas28, inesperadas
possibilidades para o humano. Há sempre um empobrecimento da razão
e do intelecto quando se pretende liquidar ou calar a imaginação,
porque esta é igualmente um dinamismo intrínseco da racionalidade
humana e das suas infindas variações.
tempo que os olhos? Porventura adormece com os sentidos do corpo? E porque é que,
muitas vezes, mesmo no sono, resistimos, e, lembrados do nosso propósito, e nele
permanecendo castissimamente, não damos nenhum assentimento a tais tentações? E,
todavia, é tão a grande a diferença que, quando sucede de outro modo, ao acordarmos,
voltamos à tranquilidade da consciência, e, pela mesma diferença, descobrimos que
não fizemos aquilo que todavia lamentamos de certo modo ter sido feito em nós.”
28Cf. CASTORIADIS C., “Imaginário e Imaginação na encruzilhada”, in Do
mundo da imaginação à imaginação do mundo, Lisboa, Fim de Século, 1999, pp.
85-106; AA.VV., Ponto De Cruz. A Grande Encruzilhada do Imaginário, Lisboa,
Instituto Português de Museus, 1998.







18 José M. Silva Rosa

BIBLIOGRAFIA
CILLERUELO Lope, “Teoría agustiniana de la imaginación”, Revista
de Psicología general y aplicada 44 (1949), pp. 451-474
COMBRONNE Patrice, “Imaginaire et théologie dans les Confessions
de saint Augustin”, Bulletin de littérature ecclésiastique 88
(1987), pp. 206-228.
COMBRONNE Patrice, Recherches sur la structure de l’imaginaire
dans les “Confessions” de saint Augustin, III vols., Diss. Paris
1979
COMBRONNE Patrice, “Recherches sur la structure de l’imaginaire
dans les Confessions de saint Augustin”, Études Augustiniennes,
Paris 1982
MAHLER Annemarie, “Medieval Image Style and Saint Augustine -
Theory of Threefold Vision”, Mediaevalia 4 (1978), pp. 277-313
MICHELET Bernadette, L’imagination de saint Augustin d’après sa
correspondance, Mémoire de diplôme d’études supérieures, Faculté
des Lettres de Dijon 1970
O’CONNELL Robert J., “The God of Saint Augustine’s Imagination”,
Thought 57 (1982), pp. 30-40
O’CONNELL Robert J., Imagination and Metaphysics in St. Augustine,
Milwaukee, 1986
O’CONNELL Robert J., Soundings in St. Augustine’s imagination,
New York 1994
POQUE Suzanne, “L’imaginaire d’un prédicateur chrétien du Ve siècle”,
Nouvelle Revue Théologique 107 (1985), pp. 867-878
POQUE Suzanne, “Où se situe l’activité de l’imagination chez un orateur
chrétien du Ve siècle?”, Annales (Université de Toulouse - Le
Mirail) 8 (1972/4), pp. 91-96
ROCKLAGE Mary Norma, A Thematical Analysis of the Imagery in
the Confessions of St. Augustin, Diss. Philos., Saint Louis University
1965, v-191 p. dactil.
SOMERS Hermann, “La gnose augustinienne: sens et valeur de la doctrine
de l’image”, Revue des Études Augustiniennes 7 (1961), pp.
1-15
TESKE Roland J., “Augustine, Maximinus and Imagination”, Augustiniana
43 (1993), pp. 27-41
TESKE Roland J., “Heresy and Imagination in St. Augustine”, Studia
patristica 27, Leuven, Peters Press, 1993, pp. 400-404
www.lusosofia.net

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Vida poeta

Vida Poeta

Sem exagero ou sentimento não há poesia.
O poeta não é matemático ou lógico,
Apenas nota e anota os fatos da vida.
Mas sem ser contraditório, supõe:
Os paradoxos e falta de lógica,
A lógica da vida paradoxal;
A ilógica da vida paradoxal.

Anotar a vida não é fácil; notá-la é ridículo.
Em tudo há vida, um absurdo.

Perceber a lógica da vida é admitir o absurdo:
A vida da lógica paradoxal ou
O paradoxo da vida, ilógico, é absurdo... como segue abaixo...
Quando se quer crescer, se quer encolher.
Porque quando crescemos, encolhemos:
Se crescermos a cada instante, seremos maiores do que somos no presente e menores do que seremos no futuro."...para crescer é preciso encolher, simultaneamente", a Alice anotou.

Mas nosso crescer é metapoético, não metafísico.
O sentido poético, longe de somar ou subtrair palavras vãs,
Sem querer multiplicar ou dividir sentimentos, esquece as funções
[lingüisticas.
Apenas se atém ao que supõe quando vê moral ou ética.
Apenas propõe o pensamento quando não as vê.
Aquelas semi-deusas orientam o poeta, sem iludi-lo.

Assim, o poeta não segue as operações básicas da matemática,
Também não se orienta pela ilógica do paradoxo;
Mais do que somar ou subtrair, pensar, propor ou impor, ele compõe.
E abrange numa só linha funções várias, metapoéticas.

Mais em função da vida breve, do tempo escasso, ele não vive.
Menos absorto ao pensamento, ilustrando o sentimento, ele não vive.
Vive reparando,
Vive discretamente.
Quer sim anotar o susto, anedota do deslumbre.
E quando faz a Vida, assim escrita, cria, como um deus.
Sem pretensão, causa e efeito.


Yuri Cavour

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

para quem gosta de física... LHC e o novo estado da matéria

Fiz algumas alterações no título da matéria apenas. Y.C.
A 10 trilhões de °C, LHC pode ter criado “novo” estado da matéria
 
Angela Joenck
No último dia 7, o Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês), maior acelerador de partículas do mundo, começou a colidir átomos pesados (de chumbo), em vez da usual colisão entre prótons, o que causou a produção de "mini big bangs". Por causa desses fenômenos, o colisor está alcançando a temperatura de 10 trilhões de °C, marca recorde em um experimento científico. "A importância deste novo fato é que espera-se com essa temperatura a criação de um novo estado da matéria, o chamado plasma de quarks e glúons", diz o brasileiro Gilvan Augusto Alves, doutor em física e colaborador do projeto do LHC.

Essa comprovação, afirma Alves, é importante para verificar se a teoria das interações fortes - a cromodinâmica quântica - descreve de forma adequada as interações que mantém as partículas unidas no núcleo do átomo.

O que é a teoria da cromodinâmica quântica?

Desde que se observou que os prótons e nêutrons são compostos de quarks, ficou claro que a mesma força que mantém o núcleo atômico unido, chamada de força nuclear forte, também é responsável por manter os quarks unidos no interior de prótons e nêutrons. "A teoria da cromodinâmica quântica explica como acontecem as interações entre quarks, e consequentemente, toda a matéria nuclear."
Na opinião de Gilvan Alves, essa teoria é importante não só pelo fato de descrever as forças que formam prótons, nêutrons e toda a matéria nuclear, mas também por explicar como se produzem todos os outros tipos de quarks, como o quark top, e até mesmo como deve ser a produção do Bóson de Higgs, um dos principais objetivos dos experimentos do LHC.

Conclusões só depois de 2012

Essa foi a primeira vez que esse tipo de colisão de núcleos foi feita no LHC, e o processo deve durar até 6 de dezembro. Alves explica que a comunidade científica não espera um resultado conclusivo agora, pois o projeto possui outros objetivos mais imediatos. "Acontece que a prioridade do LHC é descobrir o bóson de Higgs e outros fenômenos que não estejam previstos pela teoria (da cromodinâmica quântica), então as colisões de núcleos pesados tem que esperar, pois até 2012 o LHC vai operar com prótons, que é o modo de operação onde se tem mais chance de produzir esses novos fenômenos", diz o pesquisador.

"Na verdade essa confirmação leva um certo tempo, pois são necessárias várias colisões com as mesmas características para que se tenha certeza que o estado foi produzido, e nem todas as colisões produzem o plasma de quarks e glúons. Além disso, espera-se que todos os experimentos (os detectores Alice, CMS e Atlas, que fazem os registros das colisões) confirmem esse estado e isso também não é imediato", falou.

Ele define esta fase como uma espécie de teste, que verificou se o acelerador funciona bem com a colisão de núcleos. "São necessários vários meses de colisões para que se tenham dados suficientes para uma resposta conclusiva, e isso só deve acontecer depois de 2012", revelou.
O acelerador de partículas vai continuar colidindo núcleos de chumbo para estudar em detalhes esse tipo de fenômeno até o dia 6 de dezembro. Depois disso, haverá uma pausa para manutenção e, em fevereiro de 2011, retomará as colisões de prótons a 7 teraelétron-volts (TeV) - energia 3,5 vezes superior a qualquer outro acelerador de partículas, mas bem abaixo dos 14 TeV que os pesquisadores pretendem atingir em 2013 -, que devem continuar até o final de 2011.

Como o LHC não derrete?
Mesmo atingindo tal temperatura, o equipamento não derrete devido à colisão dos núcleos de chumbo ocorrer no vácuo do acelerador. Quando as partículas resultantes da colisão atingem os detectores, que estão fora do vácuo, a temperatura já é baixa o suficiente para não causar problemas ao equipamento, embora ainda cause algum tipo de dano pela radiação intensa, o que segundo Gilvan Alves, "é aceitável".

Fonte : http://noticias.terra.com.br/ciencia/noticias/0,,OI4786251-EI8147,00-A+trilhoes+de+C+LHC+pode+ter+criado+novo+estado+da+materia.html

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Assalto- Drummond

Assalto - Drummond

No quarto de hotel
a mala se abre: o tempo
dá-se em fragmentos.

Aqui habitei
mas traças conspiram
uma idade de homem
cheia de vertentes.

Roupas mudam tanto.
Éramos cinco ou seis
que hoje não me encontro,
clima revogado.

Uma doença grave
esse amor sem braços
e toda a carga leve
que súbito me arde.

No quarto de hotel
funcionam botões
chamando mocidade
fogo, canto, livro.

Vem a quarteira
depositar a branca
toalha do olvido
insinuar o branco

sabão da calma.
A perna que pensa
outrora voava
sobre telhados.

Em copo de uísque
lesmas baratas
acres lembranças
enjôo da vida.

Ponho no chapéu
restos desse homem
encontrado morto
e do nono andar

Jogo tudo fora.
A mala se fecha: o tempo
se retrai, ó concha.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Gabriel García Márquez

Lança novo livro no dia 29 de outubro.

Homo sapiens versus Neandertais versus Clima

Homo sapiens pode não ter gerado a extinção dos Neandertais, como supuseram alguns cientistas; a verdadeira causa pode ter sido o clima.

Erupções vulcânicas há milhares de anos devastaram os Neandertais na Ásia Ocidental e na Europa, relatam antropólogos na publicação “Current Anthropology”.

Naomi Cleghorn, antropóloga da Universidade do Texas em Arlington, e colegas, estudaram um assentamento de Neandertais na cordilheira do Cáucaso, no sudoeste da Rússia. Eles conseguiram identificar cinzas vulcânicas de duas erupções distintas, que ocorreram na região entre 45 mil e 40 mil anos atrás.

Recentemente, um estudo separado descobriu que houve outra grande erupção vulcânica na Itália há 40 mil anos, numa região também ocupada, na época, por Neandertais. Na ocasião, nossa própria espécie estava principalmente na África e no sul da Europa, áreas menos afetadas pelas erupções. Os Neandertais estavam concentrados na Ásia e na Europa.

“Os primeiros humanos modernos, mesmo que houvesse algum deles nas áreas afetadas, tinham populações também em outros locais”, disse ela.

Aproximadamente dois mil anos após os eventos vulcânicos (embora as datas exatas não sejam conhecidas), parece que humanos migraram para partes da Europa anteriormente ocupadas por Neandertais, dizem os antropólogos. “Gostaríamos que as pessoas examinassem mais cuidadosamente outros locais de Neandertais, para buscar com maiores detalhes indícios de eventos como este”, afirmou Cleghorn.

Com base no que os cientistas sabem atualmente, uma extinção relacionada ao clima é mais provável do que um fracasso numa batalha de inteligência entre Neandertais e humanos, segundo ela.

“É realmente difícil argumentar que eles não eram tão bons em obter recursos como os primeiros humanos modernos”, disse ela.

Tradutor:
Pedro Kuyumjian

fonte:http://noticias.uol.com.br/ultnot/cienciaesaude/ultimas-noticias/2010/10/12/a-grande-derrota-dos-neandertais-foi-para-o-clima-e-nao-para-os-humanos.jhtm

Tratamento de células-tronco

WASHINGTON, 11 outubro 2010 (AFP) - Médicos americanos iniciaram o tratamento de um paciente com derivados de células-tronco embrionárias humanas como parte do primeiro teste clínico desse tipo autorizado, o primeiro no mundo para este tratamento tão promissor quanto polêmico.

O início deste estudo clínico foi anunciado nesta segunda-feira pela empresa de biotecnologia americana Geron Corporation que obteve uma autorização da Agência Federal de Medicamentos (FDA) em janeiro de 2009.

"O início do teste clínico GRNOPC1 é uma etapa importante para os tratamentos humanos com base em células-tronco embrionárias", ressalta em um comunicado o Dr Thomas Okarma, PDG da Geron.

O principal objetivo deste teste clínico, chamado de fase 1, é avaliar a segurança e a tolerância a essas células derivadas de células-tronco embrionárias -- chamadas de GRNOPC1 -- nas pessoas paralisadas devido a uma lesão da medula espinhal.

Os participantes deste estudo devem ter sofrido seu ferimento recentemente e receber os GRNOPC1 em um período de menos de 14 dias, indica Geron.

O objetivo deste teste é injetar nos voluntários paralisados células derivadas de células-tronco embrionárias humanas na esperança de que elas possam regenerar as células nervosas danificadas e, eventualmente, permitir à pessoa de recuperar a sensibilidade e a capacidade de se mover.

O primeiro paciente foi selecionado no Centro Shepherd de Reabilitação e de Pesquisas com Ferimentos na Medula Espinhal e no Cérebro de Atlanta (Geórgia, sudeste), um dos sete potenciais centros de recrutamento de pacientes nos Estados Unidos para este teste clínico.

"Quando começamos a trabalhar neste projeto em 1999, muitos previam várias décadas antes que esses tratamentos celulares seriam aprovados para testes clínicos no homem", lembrou o Dr Okarma.

Geron já havia realizado uma série de testes pré-clínicos in vitro e também em animais de laboratório.

As células-tronco embrionárias são as únicas células do organismo com a capacidade de se multiplicar sem limite e de se transformar em qualquer tipo de célula do corpo, apresentando, com isso, um enorme potencial para o tratamento, não só de lesões na medula espinhal, como também de doenças incuráveis, como o Mal de Parkinson ou a diabetes.

O maior desafio para os pesquisadores é fazer com que essas células-tronco "se diferenciem" para se transformarem nas células que eles desejam obter, sem o risco de se transformarem em células indesejáveis, como de tumores cancerosos.

Mas a pesquisa e a utilização dessas células-tronco é controversa porque elas são retiradas de embriões humanos no primeiro estágio de seu desenvolvimento (blastócito), causando a sua destruição.

Grupos religiosos e políticos conservadores se opõem a esses procedimentos. Um juiz federal congelou em agosto os recursos federais destinados à pesquisa com estas células.

No entanto, essa decisão foi suspensa no início de outubro, permitindo a manutenção destes trabalhos pelo tempo que a corte de apelações decidir.

Em um decreto de março de 2009, o presidente Barack Obama retirou as restrições à utilização de recursos públicos impostos pelo governo Bush em 2001.

Mas esse problema poderá ser contornado graças a um novo método apresentado no final de setembro e considerado promissor para reprogramar células-tronco humanas adultas (da epiderme) que são idênticas às células embrionárias, segundo esses pesquisadores.


http://noticias.uol.com.br/ultnot/cienciaesaude/ultimas-noticias/afp/2010/10/11/eua-tem-primeiro-tratamento-de-paciente-com-celulas-tronco-embrionarias.jhtm

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Inerte ao meio

Inerte ao meio

Na agulha da ponta está o laço
o nó que segue não vem por baixo
fina e reta parece torta
àqueles que lêem por de trás
das mesmas suas que me parecem
distintas quando não atormentam
se o estarrece não é incauto
pequeno pulo mas grande salto
para o início de velhos tempos
não atingidos pelos mais moços
ainda que cultos não conscientes
de que todos servem mas não o fazem
apenas por ser não é, inerente
só pensa se é importante
para o lado que tende à queda
reduz-se um tanto que até alcança
um equilíbrio numa balança
de vários fatores preponderantes
que sobressaem em importância
por quê lhes são dado valores
a que nunca forjados foram
antes mesmo por incertezas
pareciam mas não confiavam
até ao máximo são explorados
por isso que são confidentes
de uma verdade incoveniente
quando o mentir é o soluto
o desmentir perde seu gosto
e até o cheiro fica mais fraco;
quando aberto e exposto está (a)o frasco
jorra sem fim aparente
mas não é incoerente
só não domina todos em volta
por ser mais justo do que julgado

Banho sujo (repost)

Banho sujo

De tanto brincar com fogo
O menino tomou gosto
Virou artista e apresenta espetáculos
A Vaga platéia não se anima
O troco é pago sem consenso
Mas ao menos é uma fonte de renda
Aos poucos a brincadeira vira rotina
O trabalho é agora o nome
Todo dia de sol e de chuva em cada esquina

Por pouco. Estudar com vontdade.
A vida seria melhor...
Tentou sozinho e alcançou finalmentes
Os outros não se importam se alimentam
O encosto à sombra sem vida
Ainda sustenta o resto da casa de ponte
E uma percepção é melhor desviada
Não mover-se é escolher nada
A intenção boa pode valer em cada rua

De tanto sofrer com todos
O menino jogou fora
Virou-se de costas e apresenta-se em pó
A vaga platéia continua ali
O troco é o custo sem sentido
Mas ao menos é uma prova de verdade
Aos poucos a realidade vira brinquedo
O trabalho é de renome
Todo dia de sol o ar fica mais fraco na esquina

Por pouco. Estudar sem direitos.
A vida prega peças...
Tentar sozinho é o Quase infinito
Os outros são restos e nem enxergam
O encosto é sinal de folga
Ainda debaixo da rota dos carros roncando
É uma ausência de perspectiva privada
Não mover-se pode, pois morte
A intensa que chega, sempre, em cada rua

Onde falta ao abrigo do sol
Onde anda ao pé do calçado
Onde pede ao nu de vergonha
Onde tenta ao menos comer
Onde volta ao início errante
Onde lembra ao bem-sucedido
Onde está onde foje onde briga
Sofre onde o sol não é abrigo da vida
Manca onde o sapato não tem solo sequer
Toma banho onde a nudez é castigada
Passa fome onde a comida soberba é dejeto
Espera um dia voltar ao passado onde havia
A esperança de um choro alto em uma vida
Diminuta insígnea mas ao menos justa e digna

A esperança que se torre não se colhe mais
Se a culpa soubesse de si desistiria certeira
A semelhança estende-se sem coibir as más
Sem a dupla dos deméritos, mentiria fileiras
De vezes quanto necessário, inoscência e impotência
As preces tanto evidenciaram mas apenas sozinhas,
sem ação e ajuda sem parceiros e sem companhia
Assolam o alarmado atolado no deserto quente e vago
Enquanto deliciam o gelado importado com novo frasco
Os odores não se misturam e o cheiro não perpassa
Há uma dezena de camadas de algo ou de água
Sob a superfície o entorno e a ribanceira
Ou é pena de todos ou puro eZagero contado
Pôe-se culpa em poucos esquecendo a besteira
Afinal a validade tem prazo curto no sistema
Quanto mais rápido apodrece, mais se consome
Mais mistura, se inventa; menos cultura, se corrompe
Mais dinheiro, se bebe; menos papel, se come
Mais pujância, se dorme; menos sono, se morre.

domingo, 10 de outubro de 2010

Poética - Manuel Bandeira

Poética


Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar às mulheres, etc
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare


— Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

citação

"O Brasil é um país feito por nós, basta agora desatar os nós." Barão de Itararé

Quem pode ser eleito?

Quem pode ser eleito?

O Tiririca pode ser candidato e eleito porque a lei "não exige que os candidatos possuam mediano ou elevado grau de instrução, mas apenas que tenham noções rudimentares da linguagem pátria, tanto que é preceito do próprio Estado democrático de Direito a pluralidade / diversidade, buscando-se evitar, inclusive, a formação de um elitismo no corpo dos membros dos poderes legislativo e executivo." Esta foi a declaração do juiz da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, Aloísio Sérgio Rezende Silveira. Mas agora, depois da eleição, parece que a ideia dele modificou-se. Ora, primeiro as coisas mudam e depois as ideias ou será ao contrário?

domingo, 19 de setembro de 2010

cultura mundo

Cultura Mundo

O rito é baseado no mito. O mito não pode ser contestado. Hoje não se crê em mitos e ritos, crê-se?

Se o homem não consegue perceber a diferença entre ele mesmo e o mundo externo, ele cria o sobrenatural. O homem crê que o mundo sobrenatural tem uma existência independente do homem, e do mundo externo, porque não consegue perceber que ele criou o mundo sobrenatural por simbologia, ou simbologização. E é claro que para compreender isso tudo é preciso a linguagem, o discurso articulado e a crença, retumbando, de que somente a linguagem é capaz de criar coisas originais, humanas.

Então, a própria cultura humana surge por um discurso articulado, oriundo da capacidade humana única de simbologizar. Cultura não é comportamento, nem objetos físicos; não é o material, nem o abstrato, não é nem espiritual, nem substancial, nem insubstancial. Cultura é aquilo próprio do homem, do ser-humano que não é passível de definição por ser demais complexo e simples em simultâneo. Cultura é paradoxo. Ideias contrárias que se chocam e produzem algo, se difundem. Imiscuem-se. Reproduzem-se. Chocam-se de novo. E criam de novo. (Crendo no difusionismo); Não há cultura sem interação? Há, porém tende a ser involuída. (Sendo evolucionista). E a cultura, afinal, está por toda parte? Vamos estudá-la, sejamos funcionalistas, ou estruturalistas!

Antropólogos culturais, ou sociais, biológicos ou arqueólogos, devemos estudar e ir a campo de todo modo? A prática conduz à perfeição? Ou a teoria conduz à perfeição? A teoria também é uma prática. Anotou-se. Mas a perfeição não existe, verdadeiramente. Existe o imperfeito, e eis aí a perfeição do conceito. A perfeição é conceitual apenas. É criada por um discurso, que dita as regras, emula a moda, simula a realidade, ou denota o deslumbre humano, tipicamente humano.

Com exceção para Deus. O não-conceitual, evidente.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Trajetória

Trajetória

Pastrano em potocas
Ou biologia social

EqUiLíBrIo n'uma bamba'corda
Viver n'uma tensão permanente
Não é um jogo ou um'escolha
Soma questão resiliente

Mínimo espaço centrado
Risco iminente necessariamente
Pruma queda livre agravitante
E que gravita de todo modo

Nesta excelcia tangente
Purgante vinho me abranda
A não tentar de novo
Uma pausa

Intervalo esbulho
Petição indelével
Mais simples mistério

Futuro inconsentido e preciso
Tempos vãos incréptos
Não mos trazem ou tragam mais

Escárnio riso sério
Escabeçando ou dejarretado sem solo
Flores também inúteis enfeitiçam enfeites
Transindo-me depressa
Esqueço a compencha

Desprezar também é mútuo
-E não relativo
Intentar fugir ao tempo do oblíquo
Esqueçam os solos e os dejetos
Não há nada fértil e êxcetra dijaôje

E neste prelúdio sem esperança
Um alento é apenas lembrança
De um passado que era branco e negro
E agora cinza não mede-palmos
Inabitável com exceto para os bacilos

Estes não vacilam
Aqueles no relógio antigo se perdem
E uma hora e trinta minutos não veem
Pois, ignoram a nobreza autêntica

A dentirrostra trajetória não se reverte jamais
Por isso o equívoco após o moderno
Aparente grande engano proposital
Uma solução filosófica
[Ainda não diluída


Yuri Cavour

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O beija-flor - por Tobias Barreto (1839-1889)

O Beija-flor

Tobias Barreto (1839-1889)


Era um moça franzina
Bela visão matutina
     Daquelas que é raro ver,
     Corpo esbelto, colo erguido,
     Molhando o branco vestido
     No orvalho do amanhecer.


     Vede-a lá: tímida, esquiva...
     Que boca! é a flor mais viva,
     Que agora está no jardim;
     Mordendo a polpa dos lábios
     Como quem suga o ressábio
     Dos beijos de um querubim!


     Nem viu que as auras gemeram,
     E os ramos estremeceram
     Quando um pouco ali se ergueu...
     Nos alvos dentes, viçosa,
     Parte o talo de uma rosa,
     Que docemente colheu.


     E a fresca rosa orvalhada,
     Que contrasta descorada,
     Do seu rosto a nívea tez,
     Beijando as mãozinhas suas,
     Parece que diz: nós duas!...
     E a brisa emenda: nós três! ...


     Vai nesse andar descuidoso,
     Quando um beija-flor teimoso
     Brincar entre os galhos vem,
     Sente o aroma da donzela,
     Peneira na face dela,
     E quer-lhe os lábios também


     Treme a virgem de surpresa,
     Leva do braço em defesa,
     Vai com o braço a flor da mão;
     Nas asas d’ave mimosa
     Quebra-se a flor melindrosa,
     Que rola esparsa no chão.

     Não sei o que a virgem fala,
     Que abre o peito e mais trescala
     Do trescalar de uma flor:
     Voa em cima o passarinho...
     Vai já tocando o biquinho
     Nos beiços de rubra cor.


     A moça, que se envergonha
     De correr, meio risonha
     Procura se desviar;
     Neste empenho os seios ambos
     Deixa ver; inconhos jambos
     De algum celeste pomar! ...


     Forte luta, luta incrível
     Por um beijo! É impossível
     Dizer tudo o que se deu.
     Tanta coisa, que se esquece
     Na vida!  Mas me parece
     Que o passarinho venceu! ...


     Conheço a moça franzina
     Que a fronte cândida inclina
     Ao sopro de casto amor:
     Seu rosto fica mais lindo,
     Quando ela conta sorrindo
     A história do beija-flor.

Minha poesia

Minha poesia

Minha poesia é literal.
Minha poesia é visceral.
Transparente, sem redundância ou duplo sentido.
Há apenas um sentido: o sentido.

Não se imagina mais do que a imaginação.
Não se esconde mais o sentimento belo;
O que é belo deve ser exposto, não escondido.
O que assusta de fato é a beleza, escondê-la é insano.

O que demais aparenta... é engano...
O literal é direto.
O visceral é impetuoso.
Se não se compreende em um tomo, não se dá outro.
Se bem se esquiva há um tombo, e está morto.

Não há sentido oculto, ou inconsciente.
O escrever racional, intransigente.
E aí então o engano sobressaliente...
O subconsciente sempre comanda,
E manda o pensamento ser meneado.

Está errado. É preciso expulsar os demônios.
Escrever na lata o que falta.
Escrever no ato o discurso.
Falar da boca pra fora e pra dentro.
E nunca é suficiente.

Yuri Cavour

Que é educar

Assim como em inglês, em português o verbo ducere (conduzir), latim, deu origem às palavras: duct (duto), duke (duque), educate (educar), produce (produzir), Conduzir, etc.

Porque a educação é importante, porque os duques são importantes? Porque em última instância educar alguém é ajudar este alguém a pensar de sua melhor maneira possível, alcançar o seu melhor, em uma interpretação que concordo mais. E, segundo uma explicação mais formal (também encontrada na internet):

"education / 'educar' vem do latim educare, por sua vez ligado a educere, verbo composto do prefixo ex (fora) + ducere (conduzir, levar), e significa literalmente 'conduzir para fora', ou seja, preparar o indivíduo para o mundo.
É interessante observar que o termo 'educação' em português [de Portugal?] possui uma conotação não encontrada na palavra 'education' do inglês. Enquanto que em português a palavra pode ser associada ao sentido de boas maneiras, principalmente no adjetivo 'educado', em inglês educated refere-se unicamente ao grau de instrução formal."

A origem, ou transformação, das palavras é importante, ainda que nem todas as palavras tenha sua origem tão bem conhecida ou presumível. É importante porque saber expressar-se é importante. E isto é importante porque a compreensão é importante. A compreensão é importante principalmente para haver diálogo. E o diálogo é o que em termos finais permite a vida em sociedade. E esta lição chega até as relações políticas internacionais, numa viagem mais profunda, melhor dizendo, num grau mais denso de abstração.

sábado, 28 de agosto de 2010

O tempo e o espaço são curvos. Portanto, quando distorcemos algo estamos pondo este algo a sua forma normal?'

Aqueles que não concordam exatamente com o relativismo entendem o que estou falando, não entendem? Preciso de mais contra-argumentos para me convencer do contrário. Convencer-me de que todo relativismo não tem lá suas falhas.

A questão parece perpassar uma necessidade de massas negativas, pois, o tempo e o espaço só se curvam na presença de massa, e para descurvá-los seria necessário massa negativa. É um raciocínio lógico. A anti-matéria, com seu spin oposto à matéria talvez sirva. O problema é manuseá-la.


Last true

Last true

I'm not fool but I'm felling a empity skull
I want tell you what I knew and what I feel.
Isn't true that I couldn't do this in a common way,
Just this is not my saying, it's my pray.

I have to do this without a mistake, as a law;
We can be our best confidents at all.
On the other side, I will fall
In this mantrap once for ever
And I never want to be a hidden man
With a feeling besides my brain
Keep suffering under the skin
For you.

For your safety and agreement
That we can found the judgment
Of the most truly voice: the heart.
Let's start what do not have a end
And finish what also cannot demand
A stroke to a heart in a cage.

I want you, with your fellings, spelling and true.
This new-soul winds will lead me back to you
And the windmill give me the lack as the tool
To the hope.
My last feel(ing) that only you can fullfill.

Yuri CAvour





p.s.read as: 'feeling' interchanged by 'fuel' or 'feel' (+ING)

Rio os "royalties"

333,33 reais por ano para cada cidadão fluminense é muito?

Não parece muito, mas é isso tanto que perderiam os cidadãos fluminenses com a redistribuição dos "royalties" do petróleo. Não parece muito: 333 reais por ano são quase 30 reais por mês: são R$27,78 por mês, ou noventa e três centavos por dia. Isso é muito?

Se for, basta aumentar o preço do pão francês em três centavos a unidade (dos atuais 40 centavos para 43 centavos, na média), o do combustível para veículos automotores em 11 centavos, o do feijão e arroz em catorze centavos cada e o dos remédios em 51 centavos para cobrir a perda dos royalties. Ainda não parece muito. Isto, é óbvio, se esses valores fossem impostos dados (cobrados), destinados para as mesmas áreas para as quais supostamente os "royalties" são (e se comprássemos todos estes produtos todos os dias).

Quer dizer, a questão dos royalties parece mesmo ser semântica, de ordem da violência, do respeito e da política. A letra da lei diz uma coisa, mas o foro íntimo pede outra. Um valor constitucional não é superior ao outro, há de existir a proporcionalidade, o equilíbrio nas leis. Como ao mesmo tempo é possível garantir a distribuição da riqueza à entidade Federação e dizê-la insconstitucional segundo a letra da lei? A lei está ambígua, contraditória ou demais interpretável? E se a lei está sendo modificada, não se pode reclamar inconstitucionalidade, pois talvez a lei anterior fosse inconstitucional e por isso estaria sendo modificada? Então, outra vez a geografia comanda a tudo. A questão parece injusta se contabilizado o dano imediato ou futuro, mas não parece se levantada a hipótese de ganho imediato e futuro: a diferença está no lugar. O lugar da distribuição foi o que mudou, mas o dinheiro é o mesmo. Cidades que antes não tinham nada agora terão algo, e as que muito tinham terão muito menos.

Se as cidades detentoras de riquezas petrolíferas reclamam do aumento da população e dos danos ambientais, sabem que podem agora ver esses números variado. Talvez a população sem trabalho migre, talvez mude de emprego, talvez vá poluir em outro lugar, utilizar o hospital público de outro lugar. Este outro lugar terá agora dinheiro do petróleo. Poderá investir com ele, utilizá -lo bem ou mal. Ademais a questão geográfica há a questão egoística.

Trinta reais(~R$27,78) não é o preço de um teatro, em um fim de semana, ou de uma partida de futebol? Gastar isto de uma só vez numa hora e meia parece pouco, mas em um mês parece muito. Existe aí algo errado. Um equívoco de contas, no mínimo. Diz-se ( o Governo) que a população é quem de fato perde, não o Governo; e diz-se (não o Governo) que o Governo perde e, na sequência, a população, pela perda de serviços ou por pagamentos de salários e outros investimentos. Sim, o salário é um investimento para o governo, e ele o trata assim ao reservar o dinheiro oriundo de um investimento (que é a exploração do petróleo) para pagar salários ( segundo o atual governador do Rio...).

Que esperar de novas interpretações para leis constituídas, e alteradas? Que se mude de lugar aquele que acredita na falência das Olimpíadas e da Copa, que se vê incompetente para administrar sem investimentos petrodolíferos. Que se enxergue o progresso da bandeira nacional como lema nacional, e não local como se vê e diz: que eu progrida e os outros venham até mim, até meus pés. Expulse as massas inertes saboreantes do petróleo. Doe a elas o seu regado fim de semana no cartão de crédito, pois crédito só há para quem tem dinheiro em conta, ou parece um bom investimento. Para o salário não há crédito, para os serviços públicos de qualidade não há crédito, para o meio ambiente não há crédito. Mas, espere, estes não dão retorno?

O salário volta con"sumindo-SE", pagando escolas; os serviços de saúde pública atendem quem não pode trabalhar por estar doente e o meio ambiente... até turismo ecológico há! Dá retorno, se preservado. Qual é então a ordem dos investimentos do governo para a população? Educação, Saúde e Lazer. Pontos satisfeitos. E a ordem dos investimentos para o mercado? Laissez-faire, laissez-consumer et laissez-mourir.

Examine na sua consciência: Trezentos e trinta e três reais por ano é muito para você? No que você investiria? Na poupança ou na bolsa de valores?

15.000.000: quinze milhões de pessoas é a população do Estado do Rio.
5.000.000.000: cinco bilhões de reais é quanto por ano perderá o Estado do Rio.
5 bi / 15 mi = 333,33.

No fim das contas, até parece muito.

Ah, o Petróleo é nosso! por mais abígua que essa exclamação seja...

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Dúvida, desejo.

Pensamentos principiais.

Desejar mais é algo bom, duro. Dúvidas existem para dar ao ar a graça. E assim se faz a vida. Cheia de desejos e dúvidas. Não sei ao certo porque temos tantas dúvidas, se no fim das contas não controlamos a maioria das situações apenas por falta de desejo. Sim, a perspicácia a tudo vence. Pense em uma situação na qual lhe bate uma forte dúvida... O que pode resolver este dilema? O grau do seu desejo de resolvê-la. O que pesa aqui é a palavra resolver. Pois as coisas se resolvem, para o bem ou para o mal mas se resolvem. Entretanto, talvez nunca saberemos do meio termo, pois ele de fato não existe, é apenas mais uma parte da dúvida não resolvida pelo grau do desejo. Abstraiamos, abstraiamos, abandonemos o desejo.

Que é amor

Esse texto é sensacional pela história da palavra. Ademais gostei dos comentários.


http://revistacult.uol.com.br/home/2010/05/amor-platonico/#

Marcelo P. Marques

O “amor platônico” é um dos estereótipos mais conhecidos da tradição ocidental. Se olharmos de perto os textos de Platão, ficaremos surpresos com o quanto suas ideias são distorcidas. É comum dizer que o “amor platônico” refere-se a uma relação na qual aquele que ama idealiza o outro: a pessoa amada é ideal e, portanto, inatingível. Tamanha é a distância entre o sujeito e o objeto de seu “amor”, que o outro nem fica sabendo que é amado. O texto mais conhecido de Platão sobre o amor é o diálogo O Banquete, no qual se narra o encontro de cidadãos atenienses dispostos a elogiar o deus Eros.

O amor é e não é um deus
Para os gregos antigos, o amor é um deus e tem nome próprio, Eros. Segundo Hesíodo, por exemplo, ele é um dos deuses mais antigos e atua no universo agregando os elementos e os seres.

Em O Banquete, de Platão, o personagem Fedro começa elogiando Eros como fonte dos maiores bens, inspirador dos amantes e instigador do arrebatamento nos heróis. O segundo a falar é Pausânias, para quem, na verdade, existem dois deuses: Eros urânio (celeste) e Eros pandêmio (popular), um associado à força educadora da excelência humana (virtude), outro ligado à satisfação dos apetites, de maneira irrefletida. Para o médico Erixímaco, Eros organiza os movimentos dos astros, ordena as estações e atua nos corpos de todos os seres, provocando cópulas e associações variadas. É assim que as ações do agricultor e do médico devem levar em conta a força erótica divina, seja para ter boas colheitas, seja para promover a saúde. Também o músico deve contar com o favor do deus para criar acordes, ou, sem ele, provocar dissonâncias. Agathon, o poeta trágico, propõe, por sua vez, um só Eros, do qual pinta uma imagem positiva exacerbada: ele é o mais belo, o mais jovem, o mais feliz, o mais hábil, o mais corajoso, o mais temperante; ao agir, só favorece coisas boas, como a paz e a familiaridade entre os seres.

Mas, por outro lado, o amor não é um deus. Na verdade, ele é uma dimensão interna ou estrutural dos seres humanos, força que determina as modalidades de atração, seja no sentido da procriação, seja no sentido da satisfação dos apetites, propiciando um apaziguamento que ameniza a vida e permite que todos se ocupem de seus afazeres. Segundo Aristófanes, o poder de Eros surge do fato de os humanos terem sido cortados ao meio, o que faz com que passem a vida buscando suas metades perdidas. Seja pela reprodução, seja pela satisfação proporcionada pelo sexo, é eroticamente que os indivíduos tentam restaurar sua antiga natureza.

Quando chega a vez de Sócrates falar, ele recorre à fala da sacerdotisa Diotima, para quem Eros não pode ser um deus, afinal, quem ama deseja algo que não tem; logo, o amor é uma carência. Se ele é desejo de coisas belas e boas, não pode ser belo nem bom, pois, como potência interna ao humano, não tem ou não é aquilo que busca. Os pais de Eros seriam Penia (pobreza) e Poros (recurso); mas, em vez de deuses, eles acabam se transformando em causas imanentes que fazem parte de uma nova concepção do amor: não sendo nem bom nem mau, nem belo nem feio, nem sábio nem ignorante, ele é um ser intermediário, uma potência que se situa entre o divino e o humano.

O amor é e não é um sentimento
Segundo alguns, o amor é um sentimento, ou melhor, um modo como os seres humanos são afetados perante objetos ou seres que os atraem e os marcam. Para Fedro, o amor é uma espécie de sentimento de solidariedade civil, que move os indivíduos a se associar e a construir pactos; um sentimento de amizade, reciprocidade, levando ao cuidado com o bem do outro, nobre e elevado. Em seu grau máximo, ele é o que leva o amigo guerreiro a morrer pelo seu companheiro de armas, ou ainda a fazer com que a esposa se sacrifique pelo marido.

Quando Pausânias propõe dois tipos de Eros, separa o ato de amar da maneira como realizamos esse ato. Se o ato de amar é, em si mesmo, indiferente, o sentimento que marca o modo como amamos faz a diferença; o amor instintivo e irrefletido é vil, porque não traduz uma consciência do outro. Mas o amor elevado é o sentimento que nos leva a desejar e promover o bem e o crescimento do amado.

Já na perspectiva de Aristófanes, o amor não é mero sentimento, mas algo permanente, como um modo de ser da espécie humana, na medida em que está presente no fato de sermos estruturalmente incompletos. A busca de completude determina-nos, fazendo-nos estar sempre voltados para o outro. A essa estrutura carente combinam-se graus maiores ou menores de consciência, que, por sua vez, determinam nosso modo de ser e agir.

Entre o sentimento e a estrutura, passam a entrar em jogo ainda as dimensões da significação e do conhecimento, pela dimensão da consciência da falta, que está relacionada com a consciência do outro: depois de cortar os seres humanos ao meio, Zeus gira o rosto para o lado do corte. O que eu entendo que sou, aquilo que eu significo para mim mesmo é correlato ao que eu entendo que o outro é, ou o que o outro significa para mim.

A consciência do corte está ligada ao sentimento, mas é mais do que uma experiência transitória: o indivíduo cortado tem a oportunidade de aprender que o outro não vai restaurar sua unidade originária; ele pode, assim, pela vida compartilhada e a satisfação que a convivência proporciona, amar e trabalhar de modo construtivo, menos desesperado, talvez. Sócrates critica, por um lado, a ideia de que o amor seja apenas a busca de uma suposta cara-metade; por outro lado, reforça a perspectiva que leva em conta a consciência da carência: quem sequer imagina que é deficiente naquilo que não acredita ser-lhe necessário não é capaz de desejar verdadeiramente.

Segundo Diotima, se o amor é busca, ele é um movimento que parte da falta e vai na direção de uma possibilidade de plenitude. Mas, se ele se tornar posse, deixa de ser o que é, pois perderá a qualidade de ser intermediário. Como processo, o amor parte de uma determinação ou qualidade e vai na direção do seu oposto; o feio busca o belo, o sem recurso busca o recurso, o que é ruim tende a buscar o que é bom, o ignorante deve tomar consciência de sua falta de conhecimento. O amor é decisivamente “um ser entre”.

Essa ideia do amor como processo permite associar intimamente amor e conhecimento: o amor fica entre a ignorância e o saber pleno, e a reflexão sobre o amor pode ser lida como uma definição da própria filosofia. Pois, quando o ser carente encontra o que busca, na beleza ou na excelência do outro, torna-se grávido e tem necessidade de gerar. Amar, então, é gerar na beleza, ou seja, produzir algo perante o que é belo. Para falarmos em geração, temos de supor alguma plenitude, alguma suficiência que, finalmente, transborda, vai além da mera falta e produz algo novo.

A geração deve ser pensada tanto no plano natural como no cultural. Os seres vivos estão em permanente transformação, tornando-se constantemente outros, perdendo o que têm e fabricando-se novamente. No plano biológico, a geração de outro ser é preservação da espécie; na dimensão cultural, a geração dá-se no plano da significação e do conhecimento. Um ato justo, uma atitude significativa, a produção de bens culturais são modos de constituir eroticamente a rede de valores e significações que o mundo humano é. Seja como preservação da espécie, seja como fabricação da cultura, amar significa buscar recursos para lidarmos com nossa mortalidade. Como indivíduos, nascemos carentes e morremos sozinhos, mas, como membros de uma espécie e parte integrante da comunidade humana, reunimo-nos aos nossos iguais e sobrevivemos, ou seja, permanecemos como sentido humano maior.

O amor é loucura e filosofia
No mito dos seres andróginos, contado por Aristófanes, quando dois seres cortados encontram suas metades, perdem a noção das coisas, ou seja, ficam agarrados, numa busca enlouquecida de saciedade. Por isso, param de cuidar de suas vidas, não se alimentam e acabam por morrer de amor, uma metade acoplada à outra.

A ideia de que o amor seja um tipo de loucura aparece também em outro diálogo platônico, chamado Fedro, no qual Sócrates discute os benefícios e os prejuízos de uma relação amorosa. Haveria tipos diferentes de delírios divinos, dependendo do deus responsável pela possessão: ser possuído pela Musa leva-nos a fazer poesia; ser possuído por Apolo permite-nos prever o futuro; ser possuído por Dioniso torna-nos iniciados em certos mistérios; ser possuído por Eros torna-nos filósofos. Mas, se filosofia é amor pelo conhecimento, não pode ser um desvario irracional. Deuses e ignorantes não filosofam, porque se creem sábios. A maioria dos humanos ignora sua própria ignorância, por isso age irrefletidamente. Quem toma consciência da ignorância estrutural da humanidade são os que filosofam, buscando nas coisas toda a racionalidade de que são capazes. No horizonte dessa busca, o filósofo postula um máximo de inteligibilidade, chamado de “ideia”, “forma” ou “essência” inteligível.

Por ideal, em Platão, não devemos entender algo idealizado, mas um modo de ser radical, cujas determinações sejam puramente inteligíveis. Esse máximo de ideação é mais uma aposta e uma exigência do que uma constatação; aquele que filosofa parte da precariedade e da finitude das coisas e dos homens. Para compreendê-los e educá-los (pensá-los no seu melhor), é levado a postular algo que não conhece, mas entende dever existir, apesar de invisível. A essência, então, é alguma coisa à qual temos acesso por meio da inteligência. À medida que é pensada e desenvolvida reflexivamente (diálogo), passa a ser posta como referência; algo divino, porque para além da mortalidade humana; objeto que atrai e orienta o amor e a linguagem humana.

Assim, o objeto dito “ideal” não é um objeto perfeito imaginado nem mera projeção gerada pela carência. O objeto inteligível é proposto como algo a ser pensado, conhecido e amado. Se o amor é filósofo, ele é construção racional e progressiva desse objeto. Não é a idealização ingênua da figura do ser amado, mas é abertura para o outro e, progressivamente, para uma alteridade inteligível; ele implica a relação entre corpos e almas, sempre em movimento, rumo a algum tipo de imortalidade.
O movimento do amor não pode parar: além dos belos corpos, das belas ocupações, do bem comum, dos valores políticos, da convivência na cidade (pólis), ele é exigência máxima de racionalidade, buscando a causa de tudo o que é bom e de toda beleza.

Busca de consciência e conhecimento máximos, o amor filosófico é exigência de beleza pura, mas sabe-se finito e limitado, mesmo que desejando sempre mais.

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Comentários (2)

*
Siegfried |
08/05/2010

Muito bom, mas… “ser entre” é ‘inter esse’ ou seja, um profundo interesse, o amor é isso sem dúvida! Essa ‘coisa’ gestada e não parida, bela, boa e verdadeira, só se realiza no amor humano com alguém, – o ideal não está separedo do carnal ou corporal. Algo somente inteligível é um “loucura”. Entendo que Sócrates ama aquela mulher e gesta cultura e filhos. Eros, Ágape e Philia se realizam no mundo. E é “eterno enquanto dura” como diz o poeta.
*
Pablo |
14/05/2010

Parabéns pelo excelente texto. Marcelo P. Marques conhece muito bem o assunto porque é professor,um grande mestre.
A Cult sempre fala com propriedade dos assuntos que escolhe, não entrega em mãos incapazes…

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Estação bela, fera

Estação bela, fera

Primavera.
Estação
Bela, fera

Longe, Paisagem?
Miragem.

Não há ondas de maior beleza,
Beleza solstícia.
Não há nos ventos maior frescor,
Frescor níveo.

A forma ou formato depende da época
E agora, hoje, quem fala é Tobias, Barreto,
Bilac, Drumond, inspirações, indiretas...

Sinto apenas a brisa e a brasa
Simultânea, presente, afaga.
Sinto apenas na pele e na face
De verdade, viva!

O verde é presente da natureza
Que a geografia e a história permitem.
E mais viva é a alma, sincera!
Na chuva, tímida, não dança...

Então, compreenda: o frio e o sol
Cabem no mesmo tom
E na mesma pele...

E noto, anoto:
O brilho incontido
Criança
Da lua
Combinando ao raio solto
Solar
Da rua.

Quer estar próximo e foge
Para esbarrar no auge
Sem contar infâmias

E espera por ser ela
A chuva, nublada
Assim, delicada, ou rocha
Com pétalas, ou bruta.

Enxerga apenas miragem
E foge.
Paisagem...
Captura-se de cinco em cinco
Segundos errantes:
Pálpebras não se cansam.

E sempre esteja ela
Chovendo, com sol
Mais bela.
Azul amarela.
Do mar ou da Hera.

Se espera, espera
Com fé
Carioca, mineira
De crista, de onda;

Se caduca, padece
Duma resposta
Sem questionar, no entanto;

Miragem.
Assim ela, naturalmente bela
Fria quente, chama
É uma felina manhosa
E a todos provoca.

Mas dor só sente quem sente
Algo mais
[Longe, paisagem...

Parecendo sempre distante:
Intocável mas presente
Em todo o instante.


Yuri Cavour Oliveira

terça-feira, 27 de julho de 2010

Deleuze e o Rizoma

Da Filosofia Política no tomo 3 de Mil Platôs, de Gilles Deleuze e Felix Guattari.

Sem dúvida na morfoanálise da vida um rizoma prevalece sobre a árvore, como veremos na filosofia política deste texto de Deleuze e Guattari. Parece não haver caminho até que se entrecortam raízes conflituosas, criando um novo caminho. Talvez comum, talvez estranho, mas novo porque incipiente.

Os segmentos nos cercam indicados pela bússola errante da vida. A todo instante formas de segmentaridades nos cercam, as lineares, as binárias, as circulares. E no fim parece haver uma dicotomia essencial: segmentos constituídos apenas de máquinas binárias. Decerto que não, isto não é verdade e será aqui demonstrado. Todas segmentaridades têm sua parcela e parecem existir sob duas formas, a saber, a moderna e dura, e a primitiva e flexível. Mas isso também não é correto, pois uma superposição, ou concomitância, será indicada.

Ainda, a segmentaridade é tanto molar quanto molecular, e a que mais incidiria seria a molecular, pois penetrante quando menos esperada e, portanto, causadora de maior vertigem. Isto é, tanto na atual sociedade, dita moderna, quanto nas ditas primitivas incide o rizoma, criador das possibilidades de transmutação.

No entanto, por um lado, parece que em sociedades primitivas a segmentariedade, a da máquina binária, se é mais atuante, real ou presente, é menos fortuita: há mais flexibilização na segmentariedade e essas resultariam de máquinas e de agenciamentos que não seriam eles mesmos binários. Por outro lado, nas sociedades modernas as segmentaridades binárias são mais presentes, e isso não é difícil de ser indicado: até o próprio Estado exerce sua segmentaridade nesta sociedade, além de se exercer sobre segmentos que ele mantém. E as máquinas duais erigem-se: ocorrem relações biunívocas e escolhas binarizadas, simultânea e sucessivamente.

É preciso lembrar que esta segmentariedade não é dissociada da chamada centralidade, assim chamada pelos sociólogos, na política do Estado (na sociedade moderna), a que tudo reparte ao mesmo tempo que detém unívoco poder. Quer dizer, as subdivisões do poder do Estado atêm-se a um comum, central diretório e, no entanto, esse próprio diretório seria ele mesmo todo segmentarizado. A confusão desses compartimentos do Estado contraposicionados cria processos vários defasados ou deslocados, mas ordenados.

Assim funciona a burocracia do Estado moderno: por suas repartições, deslocadas. Assim a vida moderna é sinônimo não de univocidade verdadeira, mas de autêntica segmentaridade.

No entanto, o centro está em toda parte, e a circunferência em parte alguma: há segmentaridade circular. A circularidade está presente apenas nas sociedades de Estado, as modernas, e ausente nas primitivas. Porque nas sociedades primitivas mesmo existindo o centro, ele não é concêntrico ou não funciona como um buraco-negro, o qual no fim das contas a tudo suga. Esse buraco-negro existe nas sociedades modernas, e estão assim ressonâncias nascendo e se fixando, a partir do centro. A sociedade moderna seria mais reprodutora do que criadora, salvo o rizoma; as sociedades primitivas inibiriam a ressonância, porque flexíveis.

E também existe outra forma de segmentaridade, a linear. Nesta, cada segmento é, ou torna-se, uma retificação, mas não linha reta; é realçado, homogeneizado e sobrecodificado. E nesta segmentaridade há tradução possível nas distintas existentes unidades de medida: o olho central da segmentaridade circular, representada pelo buraco-negro - o qual tudo suga no fim das contas -, tem para se deslocar um espaço, o qual é seu correlato, sendo que o próprio olho permanece estático, ignorando seus próprios deslocamentos. E se isso faz com que pareça impossível brotar novos segmentos, o centro continua a ser o denominador comum, há mais lugar para ressonâncias.

Assim, neste espaço protogeométrico, onde as figuras são inseparáveis de sua afecção, as linhas do seu devir, os segmentos de sua segmentação, o Estado liga-se à geometria de tal modo que as ideias, fixas, não dão lugar aos espaços morfológicos flexíveis, e sobrecodificações são possíveis, arredondamentos, alinhamentos, mas não linha reta orientadora. A praça pública central romana continua a inspirar o formato da vida ressonado, isto é a substituição da territorialidade pelo espaço (o geométrico e sobrecodificado, ou a reterritorialização) e o nascer das cidades é a real possibilidade por esta dura segmentação.

A segmentaridade é, sobremaneira, o resultado de uma máquina abstrata, mas diferente em sociedades primitivas e sociedades modernas, as quais existem embaralhadas umas nas outras num mundo literalmente complexo. Portanto, as suposições acima de que a segmentaridade flexível seria típica de sociedades primitivas não é de todo verdadeira.

Afinal, existe os dois tipos de segmentaridade supracitados, a saber, a molar e a molecular. E isto é válido não apenas para sociedades como também para indivíduos, os quais compõe as sociedades. Ainda, as segmentaridade são inseparáveis, se entrecortam, se imiscuem e uma pressupõe a outra. Assim sendo, o político resume tudo.

Na sequência lógica, toda política seria ao mesmo tempo macropolítica e micropolítica. O molecular consubstancia o molar, o atravessa, pode até o transformar. E todas as questões da vida pessoal, particular ou societal, estatal, se compõe pelo engolfamento molecular e molar.

Quer dizer, o molecular pode até ser menor do que o molar, inferindo no detalhe, mas pode atuar em campo social mais amplo; e a organização molar precisa se molecularizar para ser mais forte. E se os desejos, sempre agenciados, desejam a sua repressão (numa sociedade moderna do medo incidindo sobre os indivíduos e as sociedades), as repartições moleculares agem, reforçam as estruturas molares, as compõem, e há espaços vácuos a serem preenchidos sempre, as linhas de fuga aparecem, fogem da máquina binária.

Finalmente, a definição da sociedade é apresentada: as linhas de fuga. Mas esta definição analisa a micropolítica; a macropolítica pode ser analisada pelo fluxo da molaridade, mas tornar-se-á incompleta. É preciso então a composição nas análises das sociedades, compreender no mesmo tomo analítico a segmentaridade molar e a molecular, já que uma não subsiste sem a outra: a linha de segmentos se aprofundando, imergindo num fluxo de quanta.

E os fluxos e seus quanta (forças materiais e psíquicas, disponibilidades nominais de guerra) e as linha de segmentos são: o primeiro algo que tende a escapar dos códigos quando não capturado e que evade dos códigos, quando capturado, e o quanta são signos ou graus de desterritorialização no fluxo descodificado; enquanto o segundo, a linha dura, é a que implica uma sobrecodificação, substituindo os códigos desgastados, e o segmento é um reterritorialização nesta linha sobrecodificada ou sobrecodificante. O segundo tenta a todo instante capturar o primeiro, e este muda a todo instante.

Quer dizer, no campo do político, do social, a todo instante movimentos de descodificação e desterritorialização transpassam a vida das massas. Mas ao mesmo tempo, e de forma indissociável, ocorrem as sobrecodificações e reterritorializações.

Então, movimentos de massa, com seus quanta de desterritorialização e descodificação, se revezam , se precipitam a todo instante, mas é sempre o fluxo mais desterritorializado que opera a conjugação dos processos, determina a sobrecodificação e serve de base à reterritorialização a qual incide sobre as organizações binárias, de ressonância, sobre as classes.

Assim movimentos de massa podem saltar de classes a classes, mas sempre sendo diferentes (como novos quanta), modificando também as relações de classe, criando novas linhas de fuga. E a política no entanto opera por macrodecisões e escolhas binárias, molares, procurando avaliar e respeitar interesses e desejos, moleculares. Portanto o que são afetados verdadeiramente são as massas, o todo, e não as classes exclusivamente.
Então, verificamos a política obedecendo as descritas linhas: a linha de fuga, a linha dura e também a linha flexível, da composição, entrelaçamento de códigos e territorialidades. Em suma, a máquina abstrata da sobrecodificação, a qual define a segmentaridade dura, e a máquina abstrata da mutação, a qual traça as linhas de fuga, compõe o chamado estado simultâneo da máquina abstrata.

No fim, encontramos focos ou centros de poder. Encontramos em organizações tais como a Igreja, ou o Exército. São chamados focos ou centros de poder os segmentos duros; seria um ponto não necessariamente convergente, ou confuso (confundível) de outros centros de poder, mas um ponto de ressonância no horizonte, atrás dos outros centros de poder.

O Estado seria assim considerado uma caixa de ressonância para todos os outros centros de poder. E mesmo num Estado totalitário isso é verdade, com inclusive uma ressonância redobrada. Mas mesmo esses centros são compostos pelas molaridades, instáveis por si só.

E por fim, a função destes centros de poder, e eles têm limite de atuação, é a de traduzir os quanta de fluxo em segmentos de linha. E ainda que daí advenha a potência do poder, advém também a sua impotência, pois ambos se contrapõem e se equilibram, por assim dizer.

Mas não há Poder que se controle, e os próprios segmentos dependem assim de uma máquina abstrata. E quem depende do centro de poder são os agenciamentos, os mesmos, donos entre outros dos desejos, efetuam as máquinas abstratas. E os agenciamentos, finalmente, não param de adaptar as variações de massa e de fluxo aos segmentos de linha dura, em função do segmento dominante e dos segmentos dominados.

- Ainda que a esquizoanálise apresentada não se proponha fazer (por) juízos de valor, ouso eu,Yuri, fazer uma breve análise, suplementar, do entendimento das máquinas abstratas e de guerra.

Um perigo, um próximo ao do texto, o da Clareza, é o mais importante a meu ver: é de que segmentos moleculares se tornem cada vez maiores, e que o mau individualismo - entendido como tentativa incessante de viver em sintonia com um poder advindo do ego humano alimentado, de si e para si - tome conta de tal forma que centros de poder sejam formados por microfascimos, ou desejos insólitos, não reprimidos por outras formas molares de segmentaridade e até conjugados por outras formas moleculares de segmentaridades, e assumam papéis importantes, assumam lideranças talvez carismáticas, influenciadoras de massas, as quais se moveriam sem saber para centralidades destoantes em seus pontos elementares. Os quais estariam compondo na verdade centros vários, gerando assim um caos impossibilitando uma vida em sociedade, porque vontades individuais prevaleceriam de tal modo que não se admitiria uma forma de poder vigente, rumando talvez a separatismos quando não à anarquia, em última instância, ou o retorno de fascismos, com massas hipnotizadas. Interação sem ressonância não é o perigo, o perigo é não haver interação.

E como o homem no Poder adquiri poderes de sua impotência, a tendência é este homem fascista e individualista se prolongar no poder, porque se ele quer deter as linhas de fuga das massas é sim corroborado com a sociedade que “não está nem aí” para o poder, porque só pensa individualmente, querendo expandir suas capacidades individuais e esquecendo-se que para isso é preciso que trocas de informações sejam feitas, mediações, e afinal concessões, porque não existe poder verdadeiro em apenas uma ilha, a ilha da consciência própria. Apesar de que a consciência própria seja importante.

Yuri Cavour Oliveira

Quem sou eu (em agosto de 2012, pois quem se define se limita, dizem)

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Mais preocupado com a criatura do que com o criador. Existem perguntas muito complicadas. Existem respostas muito complicadas. Existem pessoas que não são complicadas. Existem pessoas que tentam complicar. Eu sou aquela que procura entender; complicando un peu primeiro para poder descomplicar. Quero dizer: se eu entender o problema de forma completa, poderei encontrar a solução mais correta, eu acho. Um sonhador, dizem. Mas não creio apenas em sonhos. Gosto mesmo é da realidade, empírica ou não. Gosto de estudar sociologia e biologia. Sou acima de tudo, e pretensamente, um filósofo, no sentido mais preciso da palavra: o sentido do amor a sabedoria, ao saber. Mas a vida é para ser levada com riso e seriedade. Sabendo-se separar uma coisa da outra, encontraremos nosso mundo, nosso lugar, nossa alegria. Nossa Vida, com letra maiúscula! "o infinito é meu teto, a poesia é minha pátria e o amor a minha religião." Eu. Um ídolo: Josué de Castro; um livro: A Brincadeira (Milan Kundera) ; um ideal: a vida.