"Sonho é destino". "Dream is destiny". You do it to yourself, you do, and that's what really 'happens'. "Tudo que não invento é falso."

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domingo, 15 de março de 2015

Farsa Trágica

Farsa Trágica.

 Para tratar sociologicamente dos recentes protestos, manifestações nacionais do último dia quinze de março, é importante ater-se aos conceitos de "campo", "poder simbólico", "distinção" e "capital cultural" em Pierre Bourdieu. E eu faria um paralelo, ainda, ao filósofo bom velhinho, vulgo Karl Marx e seu conceito de farsa histórica. Inicio com Marx, para quem a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa.

 Para tal repetição ocorrer basta ter uma base social e política apontando o devir e apoiando a querida mudança em questão, a revolução, com Marx: para haver a repetição de um evento histórico é preciso de antemão um evento inicial, com situações e motivações semelhantes, obviamente, donde se possa desprender comparação. Havendo este instrumento, esta base para comparação, tem-se a possibilidade de reflexão e repetição do evento em tempo futuro, bastando haver para tanto os apoios sociais e políticos para o evento em observação se repetir: o problema é quando falta um destes dois elementos, a saber, o apoio social ou o apoio político - o que são coisas diversas.

Daí, uno este argumento aos conceitos de Bourdieu e à atestação factual de que as manifestações que pediam o impedimento (impeachment) ou a accountability ( mesmo sem o deter do conceito é o pedido sobre isto o que parece haver, pois accountability significa prestação de contas, ou cumprir aquilo que se prometeu) eram apolíticas ou apartidárias.

Oras, nada do que se manifesta em política pode ser apolítico ou mesmo apartidário, em tempos de democracia representativa. Pode, no máximo, ser suprapartidário. Assim, faltando a base (apoio) política ou social legítimas, tem-se com Marx a tragédia e, ao fim, a farsa. Podemos estar observando a tragédia ( lembrando que no conceito grego a Tragédia ocorre quando a/o personagem assume o papel duplo de sujeito: o que sofre a ação e o que a executa, e supera o mero contar da história via moïras, musas), pois mesmo FHC ou Eduardo Cunha já falaram na impossibilidade do impedimento - ou seja, falta base (support) política - e o que se vê na rua pode ser a estrutura estruturada agindo como estrutura estruturante, como resumiria Bourdieu.

 Explico: com Bourdieu, com luxuoso auxílio em Gillés Deleuze, há um campo de imersão de classes com fluxos de informação (quanta) que age sobre o - e porque detém o - poder simbólico (violência, ou poder legítimo e legitimado porque conferido por status e não verificado, questionado - portanto, que passa incólume, invisível). Com esta "distinção" legítima e com o quanta agindo sempre da macro à micropolítica, teremos teoricamente a indução do comportamento e o chamado comportamento via ressonância: do campo de maior poder simbólico, ou numa comparação, o centro de poder (simbólico), (d)a caixa de ressonância, se ressoa uma informação a qual quanto mais refletida e mais reflexiva for, melhor.

Porém, o problema é quando a informação, a mensagem se perde no caminho, e isso geralmente ocorre. Daí estruturam-se os elementos para a tragédia, e depois a farsa. E uma vez que é através de violência (não-legítima) de poder simbólico que a atuação sobre os campos é expandida, os elementos da tragédia já se configuram.

 Quer dizer, a não-comunicação pela mesma linguagem (a falta de consenso), gera o caos, a desordem ou a revolução ilegítima. Ou golpe, em outras palavras. Portanto, o golpe só decorre pela falta de entendimento desta situação de farsa e pelo querer expresso de mudança imposta por violência que atravessa campos, violência do poder ilegítimo, violência simbólica. Em uma palavra, o poder simbólico contribui, especialmente em uma sociedade pouco instruída (onde a comunicação não se dá equanimemente sobretudo devido ao poder da distinção e do capital cultural), à movimentos de ressonância trágico-falsos.

 Por fim, o conceito de poder simbólico explica, por exemplo, e para não ficar muito abstrato, porque um jovem branco caminhando à noite em Ipanema, no Rio de Janeiro, de havaianas, não é "suspeito" e um jovem negro de havaianas em Ipanema ou qualquer subúrbio o é.

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Quem sou eu (em agosto de 2012, pois quem se define se limita, dizem)

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Mais preocupado com a criatura do que com o criador. Existem perguntas muito complicadas. Existem respostas muito complicadas. Existem pessoas que não são complicadas. Existem pessoas que tentam complicar. Eu sou aquela que procura entender; complicando un peu primeiro para poder descomplicar. Quero dizer: se eu entender o problema de forma completa, poderei encontrar a solução mais correta, eu acho. Um sonhador, dizem. Mas não creio apenas em sonhos. Gosto mesmo é da realidade, empírica ou não. Gosto de estudar sociologia e biologia. Sou acima de tudo, e pretensamente, um filósofo, no sentido mais preciso da palavra: o sentido do amor a sabedoria, ao saber. Mas a vida é para ser levada com riso e seriedade. Sabendo-se separar uma coisa da outra, encontraremos nosso mundo, nosso lugar, nossa alegria. Nossa Vida, com letra maiúscula! "o infinito é meu teto, a poesia é minha pátria e o amor a minha religião." Eu. Um ídolo: Josué de Castro; um livro: A Brincadeira (Milan Kundera) ; um ideal: a vida.