Rio polulindo: poluído mas lindo.
Estamos distantes. Distantes do mundo e espaço. Não se dão mais passos, parece.
A avenida já retumbante, e bate. E riocorro lentamente num trânsito incessante, de cidade adultescente, adulta criança, com cara de gente. Riocorrremos porque fomos alagados pelo despreparo, pecaram em nosso nome e abriram as torneiras da água do céu. Lavaram nossas almas, mas não nos afetaram. Estamos agora surfando e tomando sol nessas novas praias dessas novas ilhas, a Ilha da Tijuca e a Ilha da Lagoa. Não nos preocupamos, mandamos piadas por e-mail.
Mas nossas piadas são descontrações, pois estamos tensos. Estamos virando paulistanos paulistas, quase são-paulinos e corintianos. Não bambis, de fato, nem marginais. É um preconceito bem conceituado, apolar. Sem mais adjetivos, o tifo populacional alastrou-se. Contaminou o governo, as autoridades e tudo o mais importante sem letra maiuscula porque incompetentes. A lama se arrasta em pó e adoece olhos e narinas. E a gripe encontra um repouso. Mas as vacinas não chegam lá da mais alta estância num poder dito equilibrado.
Nos postos de saúde há jovens com medo da segura gripe tipo mortal. A água também é perigosa, lepstospirante, hepatítica. A luz que falta, a estrada bloqueada, o lixo nos bueiros, a nova jangada: caixas d'água e orelhões como bote salva-vida. E a religião semanas após a trágica chuva, vem com uma passeata de tirar os dentes. Um show para seis mil vira show para dois milhões. Mais um caos no trânsito, mais bebês passando calor no meio do Túnel Rebouças. A prefeitura assume a culpa e exime a religião. Então a praia lotada não volta pra casa, e o metrô se salva. Viva o metrô e suas paisagens!
O metrô é em parte subterrâneo, sem paisagens, a não ser em propagandas tipo quadros de cinema. A parte elevada do metrô é em parte cercada por muros, talvez por segurança, talvez por insegurança. A paisagem não é tão bonita, porque pobremente enfeitada. Mas isso é a cidade. Isso é o caos, e isto faz a diferença: o povo. Se o metrô expirra, a gripe engarrafa ou o trânsito está sem ar condicionado e estamos presos nos vagões sem luz, a piada é: "-Ei, tira a mão daí!" "- cadê minha carteira cheia de Euros!?" e por aí vai, um povo bem informado, sobre a economia internacional e sociologia masculinizada, pelo jornal do metrô, lido barra escrito na pressa dos túneis. A vacina não e visível, é risível.
Mas o povo já longe da revolta da vacina é também sério, pensamos. Pensamos reclamar pegar todo dia santo sem feriado o metrô lotado, mas o pensar é estressante e nos estressamos só de pensar. Agora há uma promoção para quem madrugar no metrô, metade do preço. Quando o mais fácil seria termos mais trens, ou mais opções de transporte. Talvez bicicletas. Porque a saúde está em pauta. A gripe se vacinada não é letal. A vacina porém não chega, não é suficiente, é preciso coragem para agir e comprá-la, e toda ação é coagida. Não há ajuda, há trapalha. A educação é esquecida no feriado e o lotado passa a ser o culpado.
Mas tutti está cambiando, fazemos provas aos domingos, estudamos entre dois feriados e, dizem-nos, nem mesmo Zumbi estaria contente com a ideia de 13 de maio virar feriado nacional. O vigésimo de novembro já é bastante como estadual. O comércio não agradece, só o comércio do turista. Àquele que comercia em várias línguas na praia, na sala ou na fazenda, no ônibus ou numa casinha de sapê, que vende sacolé. O soultaque do Rio é brasileiro, porque noveleiro, porque aconchegado de gente de todos os lados. Porque caipira in very good english é chic, em francês. E o breakfast de cada meeting é um trem "bão" de cada dia. Mas os mais arretados são mesmo os baianos, alagoanos e paraibanos logo atrás, junto com os cearenses.
O soultaque do Rio brasileiro é confuso e metido, intrometido, "introconfuso". Ao mesmo tempo que relaxa contando piadas nas drogas dos fim de semana, reclama do cotidiano sem segurança. Mas a mentira não é apercebida, são as medias, as mídias. A insegurança, o estresse todos os problemas da coluna do coração e dos nervos da cabeça são frutos de uma mentira. Que culpa tem a mente de ser violenta naturalmente e alimentada ou calma normalmente e procurada? Nenhuma, evidente. A única preocupação do carioca é saber se gasta àqueles dois e trinta e cinco do ônibus na próxima cerveja e volta a pé ou racha o táxi. Porque no racha e na camaradagem do motorista, a noite é mais barata e o dia menos.
No dia a dia do trabalho a noite toda, o horário de verão que está longe é sentido, a frente, fria, é sentida, o calor, úmido, é sentido. E não há porque reclamar por não ter dinheiro ou segurança, reclama-se da corrupção, dos abusos de poder dos chefes, da derrota do Flamengo e empate do Vasco. E comenta-se o "sacode" do "Inter de Milão maioconês" no "Barcelona messiano"... O resto é consequência da falta de saúde, aquela falta de vacina inicial. A falta inicial que é também penalty. Pois da estância superior vêm os problemas. As opressões das minorias entram em confronto com a soberania dos homens perante as mulheres. Não se admite em hipótese nenhuma o machismo, mas uma presidente mulher também já é demais.
O Rio politicamente incorreto é correto. É correto porque julga defender a minoria num regime onde a opinião da maioria deve prevalecer, sem paradoxos. Sem mais palavras estrangeiras, o melhor turismo alegre pede votos também para as melhores campanhas do verde, da estrela, da serra tucana. O Rio é também correto porque julga a mulher masculinizada mais feminista, e a obriga a despir o terno pelo decote. Para, no fim, eleger os mesmo homens de sempre, os velhos romanos da batalha grega democrática. Impossível não usar palavras estrangeiras, o português já o é. O carioca quase o é, não o é pelo amor à pátria, pela Copa que vende camisas e televisores em mais de três dimenões. E este ano, nem a conversa durante o jogo será um problema: mulheres no poder. Está quase proibido.
Proibido é fumar. Fora de moda é xingar. Mas zoar é sempre permitido. E toda zoação é ingenuamente preconceituosa quando não inteligentemente permitida, aos homens, pelas mulheres. Que mandam no fim, têm sempre a última palavra. Ainda que nos pensamentos isto não faça sentido. Na discussão elevada de gênero isso não faça sentido. Não há mais preconceitos, apenas falta de educação e desobediência. E basta irmos aos gramados e arquibancadas para perceber como um torcedor gritando "goleiro viado!" é logo reprimido por um companheiro querendo saber qual o preconceito. Não fosse a diferença de tamanho entre os dois, talvez houvesse uma tentativa de explanação. Entre o Corinthians e o Flamengo, a diferença está nas cores e local. O que determina tudo, em última instância.
Num país de preconceitos, numa cidade de estresses pelo trânsito moroso das coisas e só isso (só isso?), e pela falta de fé na política, exagero de fé na religião, o povo sempre prevalece. Menos para os seres ditos elevados, transbordantes de saber, inquebrantáveis do alto de seus castelos de cristais e marfins oriundos da exploração da ignorância. A posse passa ao largo do saber. A arte é o savoir-faire. E o laissez-faire está out por pelo menos oito meses. A decisão é do povo, repito, defensor das minorias pela maioria, ou ao contrário.
A moda dita tudo, conforme diz o ditado ainda não inventado. As crianças ditam a moda e não ao contrário, como se pensa. O consumo volta-se para elas porque elas gostam de comprar aquilo que inventam. Temos adultos crianças criando produtos na ponta da lança, para atingirem seus consumidores favoritos modificados. A relação tecnologia-criança perpassa o ipad, e o mercado mais acessado na internet é o de games, jogos eletrônicos. Agora pais ultrapassados são ultrajados pelas crianças que não lêem o manual e escrevem leem sem saber das regras novas. Pois as regras novas delas vêm, das crianças. E por isso o domínio da cidade é infantilizado, os problemas amenizados, os emos motorizados.
A adulta cidade que perdeu a maior idade há cinquenta anos agora sofre com os hormônios da descentralização política e administrativa. A sua maioridade foi reduzida e agora vota: ou ser pré-estabelecida como preguiçosa e sem função social adequada ou fica sem pré-sal, petróleo antigo e leve tudo embora nada, nada modificando o humor verdadeiro. Nada para se exercitar, criar um novo curso no vestibular, surgir uma nova holding, crescer com Eike ou com Slim. Crescer é temer e o Rio teme a desordem, mas recebe a ordem com receio. Receio de falta, receio de excesso de recreio e falta de prazos, porque o sol quente dá `aquela preguiça. Quando o que falta na verdade não é um grau de investimento do Banco Interamericano de Desenvolvimento, do Fundo Monetário Internacional ou da Bolsa de Nova Iorque, é a intergração sem entrega.
Se o Rio é o Brasil, porque rachar o Rio, porque rachar o Brasil? O sentimento não é grandeloquente para todos os lados, é humilde e quer respaldo. Porque quando um gigante cai, os tremores são sentidos nas distâncias menos prováveis. Itaipu é no Sul, Belo Monte no Norte, mas no todo se lá cai, o todo cai. Assim como o petróleo. Como a empregabilidade, estabilidade, o crescimento, o desenvolvimento, a ordem da migração. Entender a lógica destes sentidos é estender a inteligência aos ouvidos. Ouvir é sempre preciso e o Rio tem ouvido de todos e para todos. Mas a boca é uníssona. E reclama inepta. Se não há mais gargantas para votar o correto, se cante o funesto.
Assim a arte prossegue com sua falta de vacina necessária, ordinária. A adolescente cidade pormenorizada se sente quase abusada, pelos donos do poder, pelos gostos de bolsos salpicados verdes. O povo vê, assiste, sofre, doa e dá o que falar no dia a dia. Até age, em vento contra, na proa ou na popa avista um comando e, em seguida, esquece, porque lembrar é angustiante, não se esqueça. O comandante-em-chefe da batalha não é Caxias, é Cabral. E a força não é expedicionária tampouco visionária, e oportúnua. Essa força não se quer, é do mal. Só a força dos sonhos são do bem. Mas sem dormir não há sonho. É por isso que o aparente marasmo carioca, quase sonâmbulo, é inspirador. Sonhar acordado é querer o melhor mundo.
O melhor mundo é bom para todos que nele habitam. O melhor mundo é verde, sustentável, tem estrela e tucanos nas florestas tentando relampejar o que a natureza não permite. Mas a índole é uma vontade verdadeira, e mais e melhor é feito a todo instante quando o sonho é evoluir. As representações são meios das vontades, não são as vontades em si. No entanto, sem elas não há outro meio legal, apenas os radicais. Há muito não queridos. Mas os queridos também existem e são muitos. Os gostos são muitos e coexistem, não precisam ser vencidos, na maioria são vendidos. Se há sim espaço para todos, a moda comanda, e ela é majoritariamente feminina, a (falta de) representação se dá de forma estranha, na forma de aniversário eleitoral, quando todos aplaudem pelo hábito. Não pelo arbítrio, pelo pensar.
Desta forma, automática, a boiada assim autodenominada adentra o metrô, os trens ônibus e carros automóveis. E só as motos escapam, porque são mais individuais e carregam, quando muito, três. Assim ordenada a manada de gente, a população que dirige para o mesmo trajeto quotidiano discute preconceituosamente os preconceitos, reclama ignorantemente as burocracias e sorri impunemente as lamúrias. Porque lindo continua o Rio, amoar-se tolice é.
O viradão cultural é adiado pela enchente, mas não terá o fim decretado; festas e compromissos são marcados em datas simultâneas, mas isso não proibe a ideia da Maria e da Ana. Nem da Marianna. O festival de documentários, a bienal, o vulcão na Islândia também atrasaram, mas não é o fim do mundo ainda. É o fim de um mundo, particularmente universal. De um universo comprimido em poucos metros quadrados efervescentes em ideia. Projetos devem prosseguir, acreditar nas ideias e datas é um dever e uma ordem, mas hoje no dia do descobrimento ou no amanhã vivo as ideias podem morrer. Mas permanecem: pela vontade, pela garra, pela preguiça caminhante mas pensante. Não desistir é um princípio para a sobrevivência de qualquer espécie que acredita, mas o fôlego na perseguição dos compromissos não é infinito e a paciência idem. Será que somente Deus resolve tudo?
Deus é exageradamente atualmente para a física uma partícula do modelo atômico. E resolver encontrá-lo não é fácil, porém razoável. Quando tudo esta desordenado, tanto o universo quanto o seu lado é melhor mesmo descansar, criar um feriado. Relaxar e deixar porvir a solução divina. Assim o miolo não torrado é agraciado, religiosamente e ateumente. Parece mesmo não haver saídas quando o dinheiro é curto, o lirismo fajuto e o povo inculto, mas este é o mundo carioca. O justo e o injusto foram discutidos. E no fim ambos fizeram um acordo para continuarem existindo.
Fora os jovens, todos se divertem; fora os idosos, todos trabalham. Fora as crianças, todos são adultos. E se estressam pelas mentiras. As crianças, sábias por natureza, apenas vivem suas fantasias. Na praia, no cinema, na escola e no roller player games online. Não têm que se preocupar com o que não está ao seu alcance. Mas uma cidade governada pela moda, a qual é ditada pelas crianças, e que foi reduzida a maioridade transformando-a em adolescente, sem um salário digno, salário de bolsista, vê o artista ganhando como o relés. E o relés governando fantasmagoricamente, assustadoramente. A culpa de tudo não é do governo, foi do governo. Hoje a cidade adolescente já pode votar, e votou trabalhar. Esquecer que o mundo a visita pela sua beleza-alegria, tristeza e melodia que existe de noite ou de dia, não é angustiante como doravante.
Ao contrário, é estimulante. Mas não é uma droga, uma cafeína. É um esporte, uma Olimpíada. E o ritmo é do funk, frenético. Saudável no ponto do record. Recorde sempre e aja eficazmente, aprenda com o despreparo e ensine com preparo, diz-nos a cidade. Mas esta notícia receita não é notória, é antiga e reticente. Porém sem pensá-la não há quem cuide de nós. E o Brasil e o Rio é um "país feito por nós, basta agora desatar os nós". Se símbolos são interrompidos, se instituições são pixadas, há ao menos um sinal de movimento, movimento alpinista, que pensa e age alto e deve ser exemplo como figura de linguagem. Pensar alto e agir alto. E assim faz o Rio, mesmo descapitalizado, despetrolizado, mas heroico, Olímpico, Mundial.
Yuri Cavour Oliveira
"Sonho é destino". "Dream is destiny". You do it to yourself, you do, and that's what really 'happens'. "Tudo que não invento é falso."
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Quem sou eu (em agosto de 2012, pois quem se define se limita, dizem)
- Yco
- Mais preocupado com a criatura do que com o criador. Existem perguntas muito complicadas. Existem respostas muito complicadas. Existem pessoas que não são complicadas. Existem pessoas que tentam complicar. Eu sou aquela que procura entender; complicando un peu primeiro para poder descomplicar. Quero dizer: se eu entender o problema de forma completa, poderei encontrar a solução mais correta, eu acho. Um sonhador, dizem. Mas não creio apenas em sonhos. Gosto mesmo é da realidade, empírica ou não. Gosto de estudar sociologia e biologia. Sou acima de tudo, e pretensamente, um filósofo, no sentido mais preciso da palavra: o sentido do amor a sabedoria, ao saber. Mas a vida é para ser levada com riso e seriedade. Sabendo-se separar uma coisa da outra, encontraremos nosso mundo, nosso lugar, nossa alegria. Nossa Vida, com letra maiúscula! "o infinito é meu teto, a poesia é minha pátria e o amor a minha religião." Eu. Um ídolo: Josué de Castro; um livro: A Brincadeira (Milan Kundera) ; um ideal: a vida.
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